Pesquisadores dedicados a investigar as causas e os efeitos da ação humana sobre o clima – e também a estudar soluções para suas consequências – estão reunidos no Workshop do Programa Mudanças Climáticas, uma iniciativa da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp) realizada no Instituto de Geociências (IG) da Unicamp. O evento híbrido teve início no dia 27 de agosto (terça-feira), em um encontro que contou com as participações de Antonio José de Almeida Meirelles, reitor da Universidade, Célio Haddad – representando o diretor científico da Fapesp – e Luiz Aragão, do Comitê Mudanças Climáticas.
Discutir as prioridades das pesquisas globais sobre as mudanças climáticas e a transição energética é um dos focos do Workshop, que conta com as participações de representantes do Instituto Interamericano para Pesquisa sobre Mudanças Globais (IAI, na sigla em inglês), de universidades brasileiras, de entidades do governo estadual de São Paulo e do governo federal e, finalmente, de pesquisadores da Fapesp. Sua realização visa estimular o diálogo e a troca de conhecimento entre os participantes do Programa Mudanças Climáticas, para promover o desenvolvimento de parcerias e novas ideias. O desafio é urgente, afinal, conforme aponta Aragão, o aumento de temperatura sobre o continente é de cerca de 1,9º C centígrados, ultrapassando o limiar de 1,5º C já em 2024.
A reunião de cientistas com diferentes bagagens, proposta pelo encontro, visa o avanço nas questões relacionadas às mudanças climáticas. Para Meirelles, trata-se de uma ideia que dialoga com a tradição da Unicamp, isto é, promover o trabalho científico multidisciplinar. “Contamos com um conjunto de centros e núcleos estáveis, que já funcionam como unidades multidisciplinares. É o caso do Núcleo Interdisciplinar de Planejamento Energético [Nipe] e do Centro de Estudos de Energia e Petróleo [Cepetro], hoje com grande parte do seu investimento voltado para a transição energética. Já o Núcleo de Estudos e Pesquisas Ambientais [Nepam] foi um dos primeiros do gênero no país, anterior à ECO 92. Pioneiro também em vincular as ciências humanas ao tratamento da questão ambiental, possui um dos programas de maior destaque na área”, pontuou o reitor.
A ocorrência de diversas queimadas em boa parte do território paulista na semana passada, de maneira simultânea, lembra Haddad, é ilustrativa da abrangência dos efeitos resultantes dos eventos climáticos decorrentes da ação humana. “Temperaturas acima da média e a própria seca acima da média propiciam ignição, incêndios, além de problemas de saúde pública, problemas econômicos que, de certa forma, voltam a causar danos à saúde física e mental das pessoas. Atingem ecossistemas naturais e muitas espécies que, por questões relacionadas a essas próprias mudanças do clima induzidas pelo ser humano, já estão ameaçadas de extinção atualmente.”
O interesse pelo evento, segundo Aragão, superou as expectativas dos organizadores. “Estávamos esperando 150 pessoas para o evento e temos mais de 600 pessoas inscritas”, revela. Uma prova, avalia o representante do Comitê Mudanças Climáticas da Fapesp, da urgência e da relevância de se discutir o tema. “Sabemos que a crise climática a cada dia se intensifica, e é necessário prover informações, gerar conhecimento de ponta e principalmente soluções para que o país avance nas ações de mitigação, adaptação e no desenvolvimento econômico sustentável. Penso que esse diagnóstico realmente é preocupante, mas temos oportunidades de inovação em diversas áreas. Nesse sentido, a ciência e a tecnologia têm um papel fundamental, principalmente essa fomentada pela Fapesp, que é uma líder nacional na área.”
Segundo o pesquisador, na última semana, o Observatório Clima sugeriu que o Brasil deve reduzir 92% das suas emissões, para cumprir a meta de 1,5º C de aumento de temperatura até o final do século – o que dá a medida do problema. Apenas neste ano, no Brasil, foram registrados cerca de 110 mil focos de calor. “Existe um desafio muito complexo. 70% das emissões sabemos que vêm da parte do setor de florestas e agricultura, então temos que atacar isso com bastante energia, para que possamos reduzir”, afirma. Devido aos eventos extremos que têm assolado o país, o especialista defendeu o aporte de investimentos robustos e de longo prazo e propôs que se pensasse a criação de uma linha de fomento de urgência. “Com avaliação rápida das propostas, para que se possa prover diagnósticos precisos sobre os seus impactos.”
A pesquisa científica voltada para a transição energética, afirma o reitor da Unicamp, é ainda um caminho para transformar o país em protagonista desse movimento global inevitável. “É difícil não ver o Brasil como um dos países mais bem situados para a transição para uma economia baseada em recursos renováveis. Assim, temos a oportunidade de ampliar não somente a indústria vinculada à transição em geral, à melhoria das questões climáticas e à mitigação dos seus efeitos, mas também fazer uma agricultura mais sustentável. E podemos ter uma agenda que seja mais inclusiva, do ponto de vista social, porque crescimento econômico é uma boa forma, se conduzido politicamente de forma correta, de distribuir renda.”