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O que é pensar a história utilizando a inteligência artificial (IA)? Esse questionamento, somado à preocupação sobre o uso da ferramenta em sala de aula, motivou a coordenação da Olimpíada Nacional em História do Brasil (ONHB) a elaborar uma prova que incorporasse essa tecnologia. Em sua 17ª edição, a ONHB provoca uma discussão crucial para o ambiente escolar da atualidade. Desde sua fase inicial, a competição desafiou mais de 225 mil estudantes e seus professores a refletirem criticamente sobre a tecnologia e suas aplicações.

A professora Cristina Meneguello: reflxão crítica sobre a tecnologia e suas aplicações
A professora Cristina Meneguello: reflexão crítica sobre a tecnologia e suas aplicações

Atividades como a elaboração de um prompt (comando textual para a IA), a solicitação de um texto à ferramenta, a criação de uma produção textual autoral por cada equipe da competição e, por fim, a reflexão sobre as vantagens e limitações da tecnologia fizeram parte das etapas da ONHB, cuja final ocorrerá nos dias 30 e 31 de agosto, na Unicamp.

“Em vez de fugir, resolvemos cair de cabeça nessa discussão e dar a chance para os professores pensarem sobre isso nas escolas”, aponta a professora de história da Universidade e coordenadora da ONHB, Cristina Meneguello.

Para a docente, os estudantes puderam perceber, por exemplo, que a IA nem sempre consegue responder de forma satisfatória a uma demanda. “A frustração de perceber que a IA tem limites é pedagógica”, afirma.

Aplicações da IA na avaliação

Na fase inicial da Olimpíada, a prova é disponibilizada remotamente para as equipes, que têm um prazo de seis dias para resolvê-la. “Isso significa que vão trabalhar em equipe, com o professor, e que vão consultar livros, a internet etc. Justamente porque eles podem estudar, conseguimos fazer uma prova mais complexa. Isso ajuda a diminuir a diferença que existe entre os alunos de escolas particulares e os de escolas públicas. É mais o empenho que determina o resultado”, explica Meneguello.

Para contornar o uso da IA na resolução das questões, o próprio sistema de pontuação diferenciada da Olimpíada, em que cada pergunta apresenta três alternativas corretas e uma falsa, com pesos e níveis de cognição distintos, mostra-se eficiente. “A mais simples é só uma descrição. Já a alternativa que vale mais tem um conceito histórico, uma extrapolação, e a inteligência artificial escolhe quase sempre a resposta mais rasa”, afirma a professora.

A coordenadora conta que, no entanto, nas fases mais avançadas da competição, o uso da IA tornou-se mais desafiador. Além de resolver as questões de cada etapa, os participantes precisam realizar outras tarefas, como a produção de textos na quinta e penúltima fase online. Há cerca de dois anos, a organização do evento, segundo Meneguello, começou a notar o uso da ferramenta nessa fase. “Isso mudou a nossa proposta. A única forma que teríamos de restringir a IA seria voltando para uma prova tradicional, sem celular, marcando dia e horário. Discutindo o que poderíamos fazer, questionamos: ‘E se a gente fizesse o contrário? E se a gente propusesse a tarefa pedindo para eles usassem a IA e pedindo para que mostrassem o que mandaram a IA fazer?’.”

À esquerda texto produzido por Inteligência Artificial e à direita o texto produzido pelos alunos; nas fases mais avançadas da competição, o uso da IA tornou-se mais desafiador
À esquerda texto produzido por Inteligência Artificial e à direita o texto produzido pelos alunos; para a coordenadora nas fases mais avançadas da competição, o uso da IA tornou-se mais desafiador

A atividade proposta na 17ª edição da disputa seguiu essa diretriz. As equipes, formadas por três alunos e um professor, precisaram não apenas formular um comando para que a IA dissertasse sobre o tema “O impacto da tecnologia sobre a produção e difusão de conhecimento e informação ao longo da história”, mas também redigir um texto próprio sobre o mesmo assunto.

Mas como garantir a autoria dos estudantes? “Uma das formas encontradas foi pedir referências bibliográficas, coisa que a IA não sabe utilizar muito bem”, indica o historiador e coordenador assistente da ONHB, Lucas Gregate. Além disso, o texto gerado pela ferramenta também deveria ser entregue, o que criava um parâmetro de comparação e incentivava a originalidade da equipe.

“E, no fim, eles precisavam fazer uma reflexão mobilizando a ideia de debate sobre autoria e fontes. Queríamos também que os alunos entendessem o papel do professor na mediação do conhecimento, dando protagonismo para a agência humana na produção de conhecimento historiográfico”, diz.

Dentre as reflexões importantes suscitadas, frisa Gregate, está a questão da autoria. “A IA não produz conhecimento. Ela replica e bagunça a ideia de autoria porque não sabemos se nossa produção está sendo utilizada por ela para construir uma outra dissertação, uma outra tese. A gente não tem controle sobre isso mais. Por isso, trazer o professor como mediador desse processo é importante. Esse é um campo muito complexo de discussão, muito mais complexo no ensino básico, e estamos tentando, junto aos professores, achar algumas saídas. Precisamos assumir o lugar de protagonismo na discussão”, conclui.

Sobre a ONHB

A ONHB, um projeto de extensão da Unicamp desenvolvido pelo Departamento de História do Instituto de Filosofia e Ciência Humanas (IFCH), integra o programa Vagas Olímpicas da Universidade. A organização do evento conta com a participação de docentes e alunos de graduação e pós-graduação.

A avaliação sobre o desempenho dos competidores estrutura-se como um processo de aprendizagem em história e envolve seis fases online e a final presencial na Unicamp.

A 17ª edição teve início em 5 de maio, com o tema geral “Informação: produção, circulação, limites e possibilidades”. A final da competição acontecerá nos dias 30 e 31 de agosto, na Universidade, com a participação de 351 equipes, totalizando cerca de 1.400 pessoas. No sábado (30), ocorre a prova dissertativa e, no domingo, haverá o anúncio dos resultados e a cerimônia de premiação.

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