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Especialistas de 31 instituições propõem marco regulatório para uso medicinal da cannabis

O estudo apresenta soluções concretas para subsidiar a Anvisa e o Ministério da Saúde

Especialistas de 31 instituições acadêmicas e de pesquisa brasileiras acabam de finalizar um estudo que identificou, mapeou e sistematizou os principais desafios que limitam o avanço das pesquisas, no Brasil, sobre o uso medicinal da cannabis.

O grupo identificou o que chamou de sete “entraves críticos” responsáveis por obstruir tanto a pesquisa básica quanto a aplicada — nas áreas clínica, farmacêutica, veterinária, agronômica e outras — e que comprometem a eficácia dos estudos, a competitividade internacional dos brasileiros e a consolidação do país como um polo de excelência no setor.

O estudo propõe soluções concretas para subsidiar a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) e o Ministério da Saúde na elaboração de um marco regulatório abrangente e operacionalmente eficiente visando à realização de pesquisas nesse campo.

O estudo foi elaborado com a contribuição de 132 pesquisadores de instituições como a Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa), a Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC) e universidades públicas federais e estaduais, por meio de um de formulário eletrônico. Os respondentes apontaram um total de 481 problemas e/ou entraves para a realização de pesquisas com cannabis. Esses problemas foram analisados, agrupados e categorizados em sete eixos temáticos.

Desafios limitam o avanço das pesquisas para o uso medicinal da cannabis no Brasil
Desafios limitam o avanço das pesquisas para o uso medicinal da cannabis no Brasil

O primeiro dos entraves, segundo a nota técnica, dá-se com os processos de autorização das pesquisas, marcados por morosidade, subjetividade, exigências burocráticas desproporcionais e sobreposição de demandas de múltiplas instâncias, entre as quais a Anvisa, o Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento, o Ministério da Saúde, a Polícia Federal e diversos comitês internos, um quadro que, diz o estudo, gera insegurança jurídica.

Por conta disso, os pesquisadores pedem a implementação de um sistema integrado de licenciamento envolvendo esses órgãos, com regras harmonizadas e tramitação única. Além disso, defendem a concessão de autorizações globais para instituições de ciência e tecnologia (ICTs), como universidades e centros de pesquisa, autorizações essas válidas por prazos mais longos (cinco anos, por exemplo), substituindo o sistema de aprovação individual por projeto, como ocorre hoje.

O segundo entrave, de acordo com os especialistas, está na dependência da importação e dificuldade de acesso a insumos padronizados — como padrões de referência, canabinoides purificados, kits para análises genéticas, extratos, sementes, cultivares. Isso, dizem, limita a autonomia nacional e eleva os custos.

Assim, o grupo pede uma flexibilização na aquisição e manipulação, por ICT´s, de substâncias canabinoides e padrões analíticos, essenciais para a validação de métodos e o controle de qualidade.

O terceiro problema, segundo o estudo, encontra-se nas restrições ao cultivo para fins científicos e os limites arbitrários de THC. Para os especialistas, a ausência de autonomia institucional para o cultivo de e o acesso a matrizes compromete a reprodutividade e o controle de qualidade, além de inibir a condução de experimentos com cultivos em diferentes condições ambientais.

A professora Priscila Mazzola (FCF): soluções concretas
A professora Priscila Mazzola (FCF): soluções concretas

Os estudiosos pedem o estabelecimento de uma regulamentação clara sobre o cultivo para pesquisa permitindo as diversas modalidades de cultivo (estufas, telados, campos e in vitro). Além disso, defendem a permissão de autonomia institucional para que cada ICT possa definir a modalidade de cultivo mais apropriada para o desenvolvimento de suas pesquisas. Essas restrições, diz o estudo, geram um entrave que inviabiliza estudos comparativos e protocolos reprodutíveis.

Os especialistas apontam ainda a burocracia envolvendo o fluxo de materiais entre as instituições e as incertezas sobre o uso de coprodutos e derivados em pesquisa como um quinto entrave técnico e a dificuldade de colaboração interinstitucional como o sexto. Segundo disseram, os obstáculos logísticos comprometem o desenvolvimento de cadeias produtivas sustentáveis.

Por fim, dizem que a ausência de protocolos claros para pesquisas com animais de produção impede avanços em áreas como veterinária e agropecuária. Segundo os especialistas, a falta de protocolos padronizados impossibilita a geração de dados consistentes sobre dosagens seguras, períodos de carência e eficácia zootécnica, elementos essenciais para o desenvolvimento de produtos veterinários.

Para a professora Priscila Mazzola, da Faculdades de Ciências Farmacêuticas (FCF) da Unicamp — que participou do estudo —, a nota técnica “é de extrema relevância para o avanço científico e tecnológico do Brasil”. Segundo Mazzola, o estudo reúne os principais entraves enfrentados por pesquisadores que atuam com a cannabis medicinal nas mais diversas áreas e propõe soluções concretas, construídas de maneira colaborativa entre instituições de todas as regiões do país.

“A necessidade de sua implementação é urgente, pois, sem um marco regulatório claro e eficiente, o Brasil continuará em desvantagem em relação a outros países que já avançaram nesse campo estratégico”, afirma a professora. “Consolidar um ambiente regulatório significa fortalecer a pesquisa acadêmica e criar condições para a inovação, o desenvolvimento sustentável e a autonomia tecnológica nacional.”

Veja a íntegra da Nota Técnica:

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