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Alunas de graduação do Instituto de Biologia (IB) da Unicamp produziram uma série de três minidocumentários que lançam luz sobre os sapos-pingo-de-ouro (Brachycephalus spp.) e sobre a crise global de desaparecimento dos anfíbios. O projeto, contemplado pelo Edital Comunicar Ciência da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp) em parceria com o Canal Futura da Fundação Roberto Marinho, contou com a supervisão do professor Luís Felipe Toledo, do Laboratório de História Natural de Anfíbios Brasileiros do IB.

Os vídeos, disponíveis há cerca de um mês no canal de divulgação do laboratório no YouTube, já somam quase 24 mil visualizações juntos. Um alcance considerado um sucesso pelas idealizadoras do material, Júlia Checchinato e Juliane Lopes – que encontraram nesse projeto a possibilidade de trabalhar com divulgação científica e, mais especificamente, com a produção de documentários sobre a vida selvagem.

Trata-se de um campo de atuação ainda pouco explorado no país e que apresenta grande potencial de expansão. “No exterior, se você fala sobre a preservação e os animais do Brasil, todos ‘crescem os olhos’. De fato, essa é uma lacuna a ser preenchida”, afirmou Lopes.

Os sapos-pingo-de-ouro (Brachycephalus spp.) são encontrados na Serra do Japi, em Jundiaí (SP)
Os sapos-pingo-de-ouro (Brachycephalus spp.) são encontrados na Serra do Japi, em Jundiaí (SP)

Para Checchinato, o sonho de trabalhar nessa área surgiu em 2022, ao ouvir sobre essa possibilidade durante uma aula. Desde então, aproveitou as oportunidades que apareceram, realizando estágios nos quais trabalhou com a disseminação de conteúdo científico nas redes sociais. “Eu acompanhava muitos pesquisadores a campo e percebia que gostava mais de tirar fotos e filmar do que da pesquisa em si. Depois, em casa, escrevia uma história, postava no Instagram, e o pessoal adorava. Sempre tive vontade de trabalhar com isso, mas acreditava ser algo inalcançável. E, na verdade, não é”, contou.

Já para Lopes, a atividade ofereceu uma chance de testar algo diferente dentro da biologia. “Eu fazia iniciação científica em outra área, mas não estava gostando. Sempre gostei dessa parte de divulgação porque acho importante tirarmos as informações da bolha da academia, repassando para as pessoas esse conhecimento sobre o qual ninguém nunca ouviu falar. Nós, que estamos dentro da universidade, sabemos que esse não é um problema que começou agora.”

Ameaça global

Os sapos-pingo-de-ouro, que medem entre 1,25 cm e 1,97 cm, são encontrados na Serra do Japi, em Jundiaí (SP), cidade natal de Checchinato. “Queria mostrar que há vida na Serra do Japi. Muita gente não sabe da existência desse sapinho minúsculo, superespecial e carismático. Mas também queria expor essa situação na qual os anfíbios se encontram. Só de comentar isso com as pessoas, elas já ficavam surpresas. Então fazer um filme é uma forma efetiva de comunicar essa situação.”

Os minidocumentários abordam as características do sapinho e, aos poucos, se aprofundam nas ameaças enfrentadas atualmente pelos anfíbios. O conteúdo destaca a pandemia da doença chamada quitridiomicose. Causada por um fungo quitrídio da espécie Batrachochytrium dendrobatidis, essa doença interfere na respiração e no funcionamento cardíaco dos animais, já provocou a extinção de cerca de 90 espécies ao redor do mundo e impôs um declínio populacional a outras 500 – de acordo com os vídeos.

“É importante as pessoas saberem disso porque a culpa de o fungo ter se espalhado é nossa. Ele é transportado pela água, mas, principalmente, por vetores, como pessoas [seja por meio da passagem através de locais contaminados ou por meio do tráfico de animais]”, disse Lopes. Além disso, os vídeos também apontam os impactos provocados pelas mudanças climáticas e pela destruição do habitat dos bichos, deixando-os ainda mais vulneráveis.

No Brasil, 59 espécies de anfíbios sofrem algum grau de ameaça devido a esses fatores. O desaparecimento desses animais compromete o equilíbrio ambiental: posicionados no meio da cadeia alimentar, os anfíbios contribuem para controlar a população abaixo deles (ao se alimentarem de insetos e aracnídeos, por exemplo) e acima.

De acordo com Checchinato, saber que existem pesquisadores, nas universidades públicas, dedicados a esse tema é também importante. “Só de acompanhar as informações nas redes sociais já é uma forma de apoio.”

Desafios da produção audiovisual

As gravações em campo exigiram flexibilidade e criatividade
As gravações em campo exigiram flexibilidade e criatividade

Um dos desafios enfrentados pela dupla era deixar os vídeos com um caráter narrativo, fugindo de algo que se assemelhasse a uma aula de biologia. “É muito desafiador construir um roteiro envolvente e fazer a mensagem chegar às pessoas”, afirmou Lopes. A ideia passou, também, por simplificar os termos técnicos sem perder o rigor científico da informação.

O projeto, aprovado em maio de 2024, materializou-se entre agosto e dezembro do mesmo ano. As gravações em campo exigiram flexibilidade e criatividade. “A natureza não segue um script”, lembrou Checchinato, responsável pela maior parte das imagens captadas em ambientes externos. Foi preciso esperar a época chuvosa, período reprodutivo dos sapinhos, para conseguir localizá-los nas folhas. “Íamos ajustando o roteiro conforme as cenas que conseguíamos gravar. Não achamos os sapos acasalando, por exemplo. Então, inventamos outra coisa para contar a mesma história”, disse Lopes, que também realizou a narração nos vídeos.

As alunas Juliane Lopes (à esquerda) e Júlia Checchinato: vídeos sobre a vida selvagem
As alunas Juliane Lopes (à esquerda) e Júlia Checchinato: vídeos sobre a vida selvagem

Além das gravações feitas com seus próprios celulares e com equipamentos comprados por meio do auxílio financeiro do edital, as estudantes improvisaram um cenário para filmar o sapinho de perto. Nesse processo, contaram com a ajuda de uma ex-aluna da Unicamp, hoje cinegrafista da vida selvagem, Bruna Lucheze. “Foi nosso primeiro contato com um equipamento [de filmagem] mais profissional”, afirmou Checchinato.

As duas também contaram com imagens de drone e de câmera trap (armadilha fotográfica usada para captar imagens de animais selvagens) cedidas por terceiros para compor o produto final. “Esse foi um dos nossos aprendizados: faça como der. Hoje em dia, todo celular tem uma câmera razoável e você consegue fazer algo legal. Esse trabalho já serve para mostrar seu talento”, argumentou Checchinato.

A realização do projeto alterou a trajetória profissional das estudantes, que pretendem continuar nessa área e que usaram os minidocumentários para começar a montar portfólios próprios. Checchinato, que já está envolvida em outro projeto de vídeos sobre a vida selvagem, pretende, no futuro, trabalhar para popularizar esse campo profissional no Brasil.

Assista aos minidocumentários:

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