Oficinas, mesas e debate, exibição de filmes seguida de conversas com o público e a tutoria de projetos de alunos de graduação foram algumas das atividades realizadas pela cineasta Laís Bodanzky durante sua participação como convidada do Programa “Hilda Hilst” do Artista Residente do Instituto de Estudos Avançados (IdEA) da Unicamp. O ciclo terminou nesta terça-feira (12), quando pela segunda e e última vez, a diretora, roteirista e produtora de cinema participou de uma disciplina de graduação do curso de midialogia do Instituto de Artes (IA).
Cerca de 30 estudantes de graduação, sob a coordenação do professor Gilberto Sobrinho, se reuniram na sede do IdEA para apresentarem projetos audiovisuais relativos a curtas-metragens, animações, videoclipes e séries, entre outros, recebendo comentários, críticas e sugestões de Bodanzky. O primeiro encontro, também exclusivo para os estudantes da Unicamp, havia ocorrido no dia 8 de outubro.
Para a cineasta, a atividade foi “sensacional” por permitir acompanhar a evolução dos projetos e perceber como os alunos superaram as críticas e amadureceram em busca de soluções e de aprimorar suas propostas. “É lindo ver que, quando uma pessoa é insistente, ela não se deixa abater por uma crítica e cresce. Então, estou vendo muito crescimento. Esse é um processo lindo”, afirmou ao Jornal da Unicamp.
Em outubro, Bodanzky promoveu uma oficina, em dois encontros, com a leitura e discussão do projeto cinematográfico “O Silêncio” e do roteiro de longa-metragem “Pano Preto”, ambos inéditos. O primeiro é livremente inspirado na obra literária A Vida Começava Lá: Uma história de repercussão corporal (Stacchini Editorial, 2019), autobiografia de Fernando Barba (1971-2021), ex-aluno de música na Unicamp e fundador do grupo de percussão corporal Barbatuques. O livro foi escrito em parceria com Renata Ferraz Torres, irmã do músico e que esteve presente na oficina no IdEA. O roteiro de “Pano Preto”, lido por Bodanzky com o apoio de duas atrizes, tem como tema principal o desenvolvimento psíquico infantil.
Após a leitura e apresentação dos novos projetos da cineasta, os participantes puderam manifestar suas impressões sobre uma ampla gama de aspectos textuais, narrativos, de personagens e de cenário, sugerindo mudanças e oferecendo uma análise criteriosa por parte de um público diverso. Devido à grande demanda, a organização do IdEA dividiu a oficina em dois grupos de inscritos, com cerca de 50 pessoas cada. Como se trata de projetos ainda em andamento, cujos detalhes não podem vir a público, os participantes tiveram que assinar um termo de confidencialidade.
“Havia uma diversidade muito interessante de idade dos alunos, e nem todos eram do audiovisual. Havia pessoas de letras, de psicanálise. E havia pessoas que tinham o desejo de entrar na área do audiovisual. Eu senti que eles foram muito atentos, prestaram atenção em cada detalhe. Pude sentir isso nas conversas, nas sugestões, nas críticas. Senti muita seriedade. Neste ambiente da Unicamp, e da proposta que vocês trazem aqui, quem vem participar vem de verdade, com muita vontade para essa imersão. Para mim, como uma artista expondo um projeto em desenvolvimento, isso é muito rico”, afirmou a diretora, que considerou a atividade uma espécie de pesquisa qualitativa para seus projetos.
No dia 11, a cineasta participou de um bate-papo na Associação de Docentes da Unicamp (Adunicamp) com estudantes, docentes e servidores, além de pessoas de fora da Universidade, depois da exibição do drama Como Nossos Pais, lançado em 2017. Naquele evento, Bodanzky respondeu perguntas da audiência e esmiuçou a elaboração do filme, que passou por diversas versões de roteiro e por mudanças de locação, cenários e elenco, e falou sobre suas fontes de inspiração e suas referências. O roteiro desse longa-metragem, seu quarto, escrito em parceria com Luiz Bolognesi, trata, como tema central, dos conflitos pessoais da personagem Rosa, vivida pela atriz Maria Ribeiro, que busca seu espaço como profissional, mãe e companheira, superando os obstáculos impostos por uma sociedade machista.
No dia 12, na sua última atividade, aberta ao público externo, Bodanzky declarou que encerrava sua participação no Programa “Hilda Hist” do Artista Residente com um balanço muito positivo, já que o evento proporcionou muitas trocas com todos que estiveram presentes, sem falar na recepção carinhosa. “Não faz sentido eu só entregar e falar. Eu preciso também receber algo criativo, que vou levar comigo. Isso já aconteceu e muito bem, por sinal.” Segundo a cineasta, assistir novamente a suas obras, algo que não acontece com frequência, permite rever detalhes e aprimorar seu próprio processo criativo. “Eu estou desenvolvendo meus projetos e recebi da turma excelentes comentários que, do ponto de vista prático, já levo comigo. Acho muito importante a troca e acredito na troca. Por mais que o audiovisual seja o ponto de vista do diretor, trata-se de um somatório de olhares.”
No mês passado, no dia 7, na Adunicamp, um auditório lotado viu seu longa-metragem de estreia, Bicho de Sete Cabeças (2001), ao que se seguiu um debate sobre os desafios da adaptação para o cinema do livro inspirador do filme, Canto dos Malditos (1990), do escritor Austregésilo Carrano Bueno (1957-2008), que tem a questão da luta antimanicomial como mote. No dia 17, Bodanzky trouxe quatro colegas que trabalham com a produção de trilhas sonoras para ressaltar a importância da música e do som na construção de uma narrativa audiovisual. A mesa intitulada “O Cinema e a Música”, também na Adunicamp, contou com a participação dos músicos Talita del Collado, do Trio Mana Flor, André Hosoi, dos Barbatuques, Tejo Damasceno, do Coletivo Instituto, e Eduardo Bidlovski, o BiD.
Natural de São Paulo e filha do cineasta, roteirista e fotógrafo Jorge Bodanzky, diretor do longa-metragem Iracema – Uma Transa Amazônica (1974), a mais recente participante do Programa “Hilda Hilst” nasceu em um ambiente cinematográfico. Na adolescência, estudou atuação com o diretor de teatro Antunes Filho (1929-2019), tendo cursado depois cinema na Fundação Armando Alvares Penteado (Faap), onde se graduou em 1995. Sua filmografia inclui também Chega de Saudade (2007), As Melhores Coisas do Mundo (2010) e A Viagem de Pedro (2022).
Bodanzky tem também no currículo produções realizadas no teatro, onde dirigiu montagens das peças Essa Nossa Juventude (2005), de Kenneth Lonergan, e Menecma (2011), de Braulio Mantovani. Além de produtora e roteirista de cinema, coordenou, durante 15 anos, o projeto Tela Brasil, exibindo filmes em áreas periféricas do país com pouco ou nenhum acesso às salas de cinema, iniciativa que ela estima ter alcançado mais de 1,5 milhão de pessoas. Bodanzky foi a sétima artista a participar do Programa “Hilda Hilst” desde 2018, quando a iniciativa passou a ser coordenada pelo IdEA.
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