Estão em curso encontros, seminários, palestras, produção de ideias, concepção de políticas e outras atividades que deverão contribuir para alimentar a V Conferência Nacional de Ciência, Tecnologia e Inovação (5CNCTI). A 5CNCTI tem uma comissão organizadora composta por quase 50 organizações direta e indiretamente ligadas à Ciência, Tecnologia e Inovação. As ações preparatórias ocorrem em todo o país. É um momento importante e necessário, não há dúvida.
São quatro eixos que norteiam a conferência: expansão do sistema; reindustrialização com inovação; programas estratégicos nacionais; e CTI para desenvolvimento social. O moto geral é: Ciência, Tecnologia e Inovação para um Brasil Justo, Sustentável e Desenvolvido.
Temas relevantes. Difícil discordar. Difícil mesmo? Depende. Ultimamente, temos testemunhado divergências surpreendentes sobre a importância da ciência para o país. Infelizmente, seguimos achando que as pessoas têm obrigação de entender que somos importantes.
É impossível deixar de notar que não temos levantamentos sistemáticos sobre o que resultou das conferências anteriores, nem, tampouco, sobre as políticas de CTI que vêm se sucedendo nas últimas décadas — e que não são poucas. Certamente, muita coisa foi feita. Há um assunto que tem estado presente em todas as conferências (e outros fóruns) e que já está na pauta da 5CNCTI: conhecer quais tipos de retorno à sociedade e ao desenvolvimento do país têm sido alcançados pelas políticas, programas e ações de fomento à CTI que vimos empreendendo.
Temos noção de como estamos em relação a outros países apenas em indicadores que são abundantes e disponíveis, como produção científica, medida por publicações (estamos ao redor da 13ª posição) e tecnológica (medida principalmente por patentes, e somos irrelevantes na produção global). Sabemos também que o país continua mal nos rankings globais de inovação (49ª posição, em 2023, após pelo menos 25 anos de fomento à inovação).
Tudo isso já sabemos faz tempo, mas não conseguimos avaliar se o que fizemos deu resultado.
Certamente, há alguma coisa errada nas conexões entre C, T e I que nos mantém reféns dos mesmos problemas. Nas conferências preparatórias, este assunto é predominante. Participando de algumas delas e conversando com as pessoas de sempre, parece que estou vivendo no “Feitiço do Tempo” [1].
Creio que nunca atacamos para valer os problemas estruturais que nos mantêm próximos da vanguarda da ciência e, ao mesmo tempo, da retaguarda da inovação. Dou um exemplo: as políticas e instrumentos nunca focaram verdadeiramente em inovar para competir globalmente. Competir em mercados protegidos como o nosso é, para dizer o mínimo, muito pouco exigente em inovação baseada em pesquisa [2].
Todos os tópicos abordados nas preparatórias e os eixos da conferência nacional são relevantes. Os novos e os velhos. Os novos despertam expectativas e esperanças. Alguns, como Inteligência artificial e seus impactos, são excitantes. Os velhos temas despertam incredulidade e decepção: de novo falando a mesma coisa? De novo lamentando os indicadores de produção tecnológica e inovação e bolando novos programas para ver se, agora, vai? O fato é que preferimos atirar às cegas a aprender e calibrar a mira com a própria experiência.
Apesar de não haver discordâncias de que precisamos avaliar os bilhões de reais aplicados em centenas de programas (sim, centenas, vejam, neste link, um exemplo: http://bi.cnpq.br/painel/fomento-cti/ [3]), em dezenas de milhares de bolsas e em milhares de projetos financiados com recursos dos Tesouros (federal e estaduais), na hora H, não alocamos recursos financeiros, humanos e de dados para desenhar, implementar, monitorar e avaliar políticas baseadas em informação.
Vivemos, há décadas, o empilhamento das políticas de CTI. A 5CNCTI precisa, além dos seus relevantes eixos temáticos, ter um eixo transversal: usar a ciência para conhecer e aprender os resultados e os impactos do que já foi feito.
As boas ideias saídas das boas cabeças que temos ficarão bem melhores e trarão mais e maiores resultados se forem bem informadas sobre o que deu e o que não deu certo. Que se adotem os manuais do Conselho de Monitoramento e Avaliação de Políticas (CMAP), tanto o ex-ante, que nos ajuda e desenhar políticas de forma profissional, como o ex-post, que nos ensina a avaliar resultados e impactos e a realimentar o processo [3]. Sem isso, na sexta Conferência estaremos de novo discutindo as mesmas velhas questões.
Este texto não reflete, necessariamente, a opinião da Unicamp.
[1] Para quem não assistiu ao filme “O Feitiço do Tempo” (Groundhog day, no título original), é diversão boa e didática.
[2] Os números são assustadores: nas últimas três décadas, o Brasil esteve sistematicamente entre as cinco economias mais fechadas do mundo. Apesar de termos o 9o ou 10o PIB global, estamos próximos da 30a posição tanto em exportação como em importação medidas por valor.
[3] https://www.gov.br/planejamento/pt-br/acesso-a-informacao/participacao-social/conselhos-e-orgaos-colegiados/cmap