Toda a poesia publicada por Carlos Vogt está reunida no site Cantografia, de livre acesso, que teve uma nova versão lançada em fevereiro deste ano.
O site está organizado em seções dedicadas aos livros Novos Poemas (2016), Pisca-alerta (2007), Ilhas Brasil (2002), Mascarada (1997), Metalurgia (1991) Geração (1985), Paisagem Doméstica (1984) e Cantografia (1982).
Há ainda a seção dinâmica A Cidade e os Livros, atualizada periodicamente com novos poemas, como o recente Poética Tardia (veja abaixo).
Em entrevista ao Jornal da Unicamp, o professor emérito da Unicamp Carlos Vogt aborda a dualidade presente em sua obra, expressada por uma dialética entre poemas curtos e longos, além da sua trajetória como poeta.
Com ampla vivência nos universos da ciência e da poesia, ele destaca o papel da linguagem poética na divulgação científica: “Sem comunicação, não há ciência.”
Fundador do Laboratório de Estudos Avançados em Jornalismo (Labjor) da Unicamp, tradicionalmente publica poemas também na revista digital ComCiência.
Carlos Vogt foi reitor da Unicamp, presidente da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp), secretário de Ensino Superior do Estado de São Paulo, presidente da Universidade Virtual do Estado de São Paulo (Univesp) e vice-presidente da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC).
Jornal da Unicamp – O que observa ao contemplar as décadas de produção poética compiladas no site Cantografia?
Carlos Vogt – A obra tem uma tônica que é a relação entre o poema curto, epigramático, e o poema longo, mais narrativo. Esta relação reflete não só uma questão formal, mas temática. Em geral, os poemas curtos são voltados para uma reflexão do que está fora, do poeta com as coisas do mundo. Já os poemas longos refletem mais enfaticamente uma relação com as coisas de dentro, as coisas da memória, a vivência pessoal. Essa dialética é importante para a expressão da relação do poeta consigo mesmo, com as coisas do mundo, com as coisas subjetivas e com tudo isso misturado. É dessa mistura que nasce a transformação e o movimento da poesia.
JU – Como funciona essa relação entre os dois formatos de poema em sua obra?
Carlos Vogt – O poema metalurgia, que dá nome ao livro em que foi publicado, é bem importante para entender essa dialética. Na poesia, você trabalha esmerilhando a matéria. Pelo esmerilho, o poema toma forma e se configura como um objeto fechado, completo, como um ovo. E, nesse esmerilhar, como em uma atividade metalúrgica, acumulam-se limalhas, que são as sobras da matéria trabalhada para dar forma ao poema. As limalhas são restos que eu recolho do chão e utilizo como matéria e expressão nos poemas longos. Então, é como se o poema longo fosse feito das sobras do poema curto, e o poema curto, desse enxugamento do poema longo.
JU – O que mudou na nova versão do site?
Carlos Vogt – O tema da publicação eletrônica está intrinsecamente ligado às tecnologias utilizadas, que mudam constantemente. Isso afeta não apenas a visibilidade, mas também a própria empatia do site, especialmente quando se trata de poesia. A versão de 2008 era muito bonita, mas tinha limitações. Hoje, o site está mais limpo, navegável e agradável. Se novos leitores lerem e se identificarem com minha poesia, já é uma recompensa enorme.
JU – Como se iniciou sua trajetória de aproximação com a poesia?
Carlos Vogt – Desde que eu me lembro — porque essas coisas têm a ver com a memória, que é ao mesmo tempo seletiva e mentirosa —, sempre tive uma atração, uma fascinação pela poesia. Desde garoto, já tentava escrever. Essa afeição, essa empatia pela poesia que eu comecei a ler nas cartilhas do primário foi reforçada por um professor que tive no ginásio, Ciro Armando Cattapreta, também escritor e poeta. Fui então exercitando esse gosto aos poucos, desde o poema mais confessional, relacionado ao cotidiano, aos sabores e dissabores da vida adolescente, aos primeiros amores, essa coisa toda, até uma poesia encantada com a própria poesia e fascinada pelas questões sociais — pelas questões, digamos, do mundo objetivo e da percepção que essa objetividade produz na subjetividade.
JU – As mais novas tecnologias de inteligência artificial gerativa têm causado controvérsias em relação à autoria dos textos e obras produzidos por elas. O que você pensa sobre essa questão?
Carlos Vogt – Penso que caminharemos para formas e conteúdos legislativos cujas configurações ainda não vemos com a nitidez necessária. Contudo, acho que as máquinas inteligentes, não só no caso de autoria de obras, deverão constituir um capítulo à parte nos princípios de normatização das relações na sociedade imediatamente futura.
JU – Como os universos da ciência e da poesia se articulam?
Carlos Vogt – Essa interação é fundamental. Sem comunicação, não há ciência. A dinâmica do processo de formação da cultura científica se movimenta em quatro momentos: a comunicação entre pares cientistas; o ensino da ciência; o despertar do interesse público pela ciência; e, por fim, a divulgação científica. Cada momento tem sua especificidade linguística. O primeiro momento é expresso em linguagem altamente cifrada, de profundo hermetismo. Já no momento da divulgação, busca-se expressar a ciência de acordo com os códigos comuns a todos nós. E, para isso, é preciso lançar mão de uma linguagem figurada — ou seja, linguagem poética. Então, é fundamental que essa relação seja consistente.
Poética Tardia
Se a empresa
da poesia
for o poeta
não haverá
como confundir
a métrica
com a meta