

Escombros traz novo olhar sobre demolição da Igreja do Rosário, em Campinas
O documentário, que começa a fazer carreira no circuito dos festivais, foi criado por uma equipe da Faculdade de Educação da Unicamp
O documentário em curta-metragem Escombros, que repassa a história da demolição da Igreja Nossa Senhora do Rosário de Campinas, nos anos 1950, após uma série de exibições na cidade, em julho, começa sua carreira em festivais e deve ser ampliado para virar um projeto multiplataforma. “Estamos inscritos em diversos festivais e fomos selecionados para a 15ª edição da Mostra Curta Audiovisual, que tem curadoria coletiva, em setembro. Escombros está nos levando para novos lugares”, diz a professora colaboradora do mestrado em educação profissional da Faculdade de Educação (FE) da Unicamp Claudia Amoroso Bortolato, diretora, roteirista e coordenadora da ampla pesquisa envolvida no projeto.

O curta, com duração de 15 minutos e codirigido por Fabrício Borges, ganhou patrocínio por meio da Lei Paulo Gustavo (LPG), de incentivo cultural. A ideia de abordar a demolição da igreja nasceu de um debate ocorrido em sala de aula. “Estávamos estudando um texto de Walter Benjamin, analisando diferentes traduções e versões, e chegamos às palavras ‘documento’ e ‘monumento’, que ocupavam o mesmo lugar em algumas traduções”, conta Bortolato.
Naqueles dias, uma amiga da professora, a pedagoga Maria Cecília de Miranda Menke, contou que, aos 19 anos, ainda uma normalista, escreveu um manifesto, no extinto jornal Diário do Povo, contra a demolição da igreja. “Pensamos em algumas ideias para um curta, e a Islaine Garcia [responsável pela coordenação da produção] deu a ideia de abordar a história da demolição da Igreja do Rosário”, lembra.

Com mais de 17 horas de gravação captadas em seis meses, incluindo entrevistas com 11 personagens, entre eles moradores de Campinas que testemunharam a demolição, e imagens de arquivo com recortes de jornais, do cineasta Henrique de Oliveira Jr. e do Museu da Imagem e do Som de Campinas (MIS-Campinas), foram criadas três linhas de narração. Na primeira estão os que vivenciaram o fato; na segunda há a experiência do outro, apresentada por meio de entrevistas com pesquisadores, arquitetos e especialistas em patrimônio; na terceira, encontra-se o flâneur, um observador, personagem vivido pelo ator Felipe Mion.

“A partir dos depoimentos e das pesquisas, observamos que a demolição da igreja foi parte de um projeto de ‘higienização da cidade’, um apagamento da memória”, destaca Carolina de Mattos Spagnol, orientanda de Bortolato na FE e professora da rede municipal de ensino, que integrou a equipe de pesquisa.
Aos olhos oficiais, a Igreja do Rosário foi demolida no dia 12 de maio de 1956, em nome do “progresso”, para o alargamento das avenidas centrais, a partir do plano de modernização urbana de Francisco Prestes Maia, apresentado em 1938 e que mudaria Campinas para sempre. O projeto gerou polêmica e, no início da década de 1950, a igreja acabou interditada sob a justificativa de que, como precisaria de muitos reparos, deveria ser, idealmente, colocada abaixo.

“O local era um ponto de encontro da população negra desde sua fundação e, com a demolição, essa população se dispersou. Ao resgatar a história”, destaca Spagnol, “fizemos o que a gente é capaz. Não somos brancos salvadores, mas podemos trabalhar com a reparação histórica.” As pesquisas chegaram aos arquivos da Câmara Municipal e do Centro de Ciências, Letras e Artes (CCLA), lembra Dulce Zorzenon, também integrante do grupo de pesquisa. “A cada gravação, apareciam mais ideias de pesquisa.”
“Depois de pronto, levamos o curta-metragem para as escolas, antes do lançamento oficial. A reação dos alunos, de quem não conhecia a história, foi muito interessante”, lembra Bortolato.” Após percorrer os festivais, a ideia é disponibilizar Escombros nas plataformas digitais e, no projeto multiplataforma, criar um site para publicar os depoimentos na íntegra.
Confira o histórico desde a inauguração da Igreja Nossa Senhora do Rosário, em Campinas: