Com foco no Brasil, um artigo publicado na revista Sustainability identifica as barreiras e os fatores facilitadores para a introdução de tecnologias digitais na agricultura na América Latina. O trabalho compara achados acadêmicos e empíricos, levando em conta a realidade de pequenos e médios produtores vinculados ao Centro de Ciência para o Desenvolvimento em Agricultura Digital (CCD-AD/Semear Digital), espalhados por dez distritos agrotecnológicos (DATs) de todas as regiões brasileiras. Criado em 2022, o Semear Digital é sediado na Embrapa Agricultura Digital (no campus da Unicamp em Campinas) e tem financiamento da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp).

A pesquisa foi desenvolvida por Thais Dibbern, professora da Faculdade de Ciências Aplicadas (FCA) da Universidade e coordenadora do Laboratório de Estudos do Setor Público (Lesp), durante seu pós-doutorado na Embrapa Agricultura Digital. Dibbern continua atuando como pesquisadora associada do Semear Digital. Também assinam o artigo a coordenadora do centro e presidente da Embrapa, Silvia Massruhá, e a pesquisadora da Embrapa Agricultura Digital Luciana Romani.
O estudo baseou-se em uma abordagem mista, comparando as barreiras e potencialidades identificadas por meio de um estudo bibliométrico — com a seleção de palavras-chaves em bases de dados latino-americanas — e dados empíricos coletados nos DATs junto aos produtores rurais.
A falta de recursos financeiros e de alfabetização digital, a desconfiança dos produtores, a ausência de infraestrutura e o alto custo dos equipamentos estão entre as principais barreiras para a adoção das novas tecnologias. Diante desse panorama, o artigo sugere ações que podem ser implementadas pelo poder público. “Uma política pública de Estado consistiria em levar conectividade não apenas à sede da propriedade, mas ao campo também, onde a produção realmente acontece”, explica Dibbern.

A criação de programas de capacitação digital, em parceria com cooperativas agropecuárias, também consta entre as ações sugeridas. Isso porque, nas cooperativas, há o compartilhamento não só de conhecimento como também dos próprios equipamentos e tecnologias, barateando o custo de aquisição. “Acredito que essa é uma das principais formas de democratizar o acesso”, afirma a pesquisadora.
Outra proposta é a criação de instrumentos financeiros específicos para médios e pequenos produtores. Embora existam políticas públicas de incentivo, a professora esclarece que parte dos produtores não as conhecem. Por isso, Dibbern trabalha também na sistematização dessas informações para ampliar seu alcance.

No contexto dos DATs, a insegurança em relação à titularidade da terra, principalmente em assentamentos rurais, figura entre os entraves para a decisão de investir em novas tecnologias, o que chamou a atenção da pesquisadora. “Isso pode ser solucionado por meio da reforma agrária, fazendo com que os produtores tenham mais segurança sobre aquilo que produzem naquele território.”
Ganho de produtividade e sustentabilidade
A pesquisadora avalia como fundamental o apoio estatal para alavancar a digitalização no campo. “O Estado consegue, por meio da identificação dessas barreiras, formular políticas públicas mais orientadas para que os produtores pequenos e médios possam fazer uso dessas tecnologias digitais e deixem suas cadeias produtivas mais sustentáveis e eficientes.”
Entre as vantagens da adoção da agricultura digital, estão o aumento da produtividade e o aumento da competitividade em todas as etapas de produção — por meio, por exemplo, da pulverização automática de fertilizantes e defensivos feita por drones controlados por meio de tablets.

No caso da piscicultura, sensores colocados dentro dos tanques de criação de tilápias, por exemplo, podem determinar com precisão a quantidade de animais presentes ali, utilizar dados climáticos e otimizar a dispersão de ração. Esses são exemplos, afirma Dibbern, que demonstram o potencial da tecnologia para tornar a produção rural mais eficiente e sustentável, facilitando o trabalho no campo e economizando custos e insumos.
Além desse estudo, a pesquisadora já conta com outro artigo publicado e outros em fase de avaliação para publicação, todos frutos do pós-doutorado. Uma das pesquisas criou indicadores sobre a inovação na agricultura digital. “O produtor rural coloca as informações da sua propriedade e da tecnologia que quer adotar. O sistema gera uma escala de sucesso de 1 a 5, do pior ao melhor resultado. Do mesmo modo, o desenvolvedor da tecnologia também é capaz de utilizar esse sistema, que indicará as melhores localidades para sua comercialização”, conta Dibbern. Outro projeto foca a sucessão familiar no campo, considerando as perspectivas de produtores e jovens. Há, ainda, a expectativa de expandir a iniciativa dos DATs para outras localidades.