Finalizada na madrugada do dia 24, a 29a Conferência das Nações Unidas sobre as Mudanças Climáticas (COP29) fixou em US$ 300 bilhões anuais o valor dos investimentos, até 2035, por parte dos países desenvolvidos, no chamado financiamento climático, tema central da agenda de discussões do evento, que aconteceu em Baku (Azerbaijão). Esses recursos são imprescindíveis para viabilizar as ações de adaptação e mitigação e para a transição energética, especialmente no caso dos países em desenvolvimento. Além de pelos governos, essas ações podem e devem ser implementadas por outros atores, incluindo os governos municipais, as empresas, os investidores de um modo geral e as universidades. No caso dessas últimas, como referência de modelos de gestão e de ocupação mais sustentáveis e/ou como geradoras de conhecimento.
A comitiva da Unicamp na COP29, entre outras atividades, buscou justamente consolidar a participação da Universidade na Higher Education Climate Network of Networks (NoN), uma coalizão de instituições e redes do clima ligadas ao ensino superior de todo o mundo comprometidas com acelerar a implementação das metas climáticas estabelecidas pelo Acordo de Paris (2016). A NoN reúne entidades de ensino superior com o objetivo de ampliar o papel das universidades nos esforços de adaptação à emergência climática ancorada nas prioridades estabelecidas pela Parceria de Marrakech para a Ação Climática Global. Lançada na COP22, realizada em Marrakech (Marrocos), em 2016, a parceria é uma plataforma global que tem como meta promover a colaboração entre governos e organizações da sociedade civil para a troca de conhecimento e a implementação de soluções conjuntas em busca de reduzir as emissões dos gases do efeito estufa e aumentar a resiliência das comunidades no contexto das mudanças climáticas.
Segundo Steve Davison, diretor do programa Cambridge Zero, da Universidade de Cambridge (Reino Unido) e um dos coordenadores da NoN, a motivação para criar a “rede das redes” foi a necessidade de aprimorar a conectividade entre as instituições de ensino superior a fim de facilitar o compartilhamento de informações e fortalecer o engajamento das universidades com a sociedade e com o setor educacional como um todo de modo a acelerar o processo de implementação de objetivos e resoluções internacionais sobre o meio ambiente e o clima. “Queremos criar uma estrutura para fortalecer o diálogo das universidades com a sociedade”, afirmou Davison. “Um dos caminhos para isso é ampliar nossa participação nas COPs com o objetivo de reforçar a importância da educação e da ciência no enfrentamento da emergência climática.”
“A política climática é embasada em ciência. O Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas (IPCC, na sigla em inglês) tem desempenhado um papel emblemático ao apoiar a Convenção do Clima por meio de sínteses sobre a ciência global da mudança climática”, pontuou David Lapola, representante da coordenação científica da comitiva da Unicamp na COP29, pesquisador do Centro de Pesquisas Meteorológicas e Climáticas Aplicadas à Agricultura (Cepagri) e um dos coordenadores do projeto AmazonFace. Lapola lembra, no entanto, que o IPCC publica seus relatórios a cada seis ou sete anos. “A participação das universidades nas COPs é fundamental no sentido de comunicar os avanços e as novidades da ciência de modo mais ágil”, considera o pesquisador.
As reuniões da COP, organizadas pelo país-sede em colaboração com a secretaria da Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre Mudanças Climáticas (UNFCCC, na sigla em inglês) e entidades parceiras, ocorrem anualmente. A participação no evento depende de um credenciamento prévio. Em termos de estrutura, a COP dividide-se em duas áreas. Na blue zone, à qual têm acesso apenas os representantes dos países-membros e os observadores credenciados, ocorrem as negociações oficiais e as sessões plenárias. Nessa área estão os pavilhões dos países e acontecem eventos do organizador local e algumas atividades paralelas. Já a green zone é uma parte mais acessível, reservada para eventos não oficiais, exposições, workshops e atividades de outros atores, como organizações não governamentais (ONGs), empresas e instituições acadêmicas. Criada para gerar oportunidades de compartilhamento, a green zone pretende receber um público mais amplo.
Desde a COP28, por meio da International Sustainable Campus Network (ISCN), a Unicamp vem discutindo a possibilidade de estabelecer um pavilhão das universidades na blue zone da COP30, a ocorrer em Belém. “A filiação da Unicamp à ISCN é importante porque essa entidade reúne universidades de todo o mundo, o que dá mais credibilidade às nossas iniciativas junto às COPs”, afirmou a arquiteta e urbanista Thalita Dalbelo, coordenadora da Divisão de Sustentabilidade da Unicamp. “A opção por ter um pavilhão na blue zone é estratégica porque nessa área circulam as pessoas com maior poder de decisão nas COPs, uma área onde as universidades podem ser mais representativas nos esforços colaborativos e nos alinhamentos relativos às metas de redução de emissões de gases de efeito estufa.”
Entre os próximos passos para consolidar a ideia do pavilhão junto à organização da COP30, inclui-se elaborar um Memorando de Entendimento a ser assinado por todas as universidades que participam da NoN. O documento deve ser entregue pessoalmente pelo reitor da Unicamp, Antonio José de Almeida Meirelles, ao vice-presidente Geraldo Alckmin, encarregado de presidir a organização da COP30. A Unicamp pretende criar uma comissão para organizar sua participação na COP30. Caberá à Coordenadoria de Divisão de Sustentabilidade (CSUS) presidir essa comissão.
A diretora do Comitê Consultivo sobre Meio Ambiente, Mudanças Climáticas e Sustentabilidade da Universidade de Toronto, Kristy Faccer, considera estratégico trabalhar em conjunto com as universidades brasileiras para criar o pavilhão das instituições do ensino superior na COP30. “Podemos gerar um impacto maior, especialmente no sentido de uma aproximação com a agenda das cidades na implementação de medidas de redução de emissões”, disse Faccer, uma das coordenadoras da NoN.
O líder da comitiva da Unicamp na COP29, Roberto Donato, lembrou que a presença de pesquisadores brasileiros nas COPs tem sido importante, mas que essa participação tem ocorrido de modo individual ou a partir de grandes projetos. “Sem dúvida, isso é positivo. Pretendemos, no entanto, incluir a universidade de forma institucional, a partir das suas atividades-fim: pesquisa, ensino e extensão, mostrando as atividades e os projetos dos campi que podem ser replicados”, afirmou Donato. “Com isso, amplia-se o potencial de indução política para a construção de políticas públicas em parceria com o governo e com a sociedade.”
Veja abaixo a lista de universidades e de redes que compõem a Non até agora:
- Azerbaijan Universities Network on Climate Change (AUNCC)
- UAE Universities Climate network (UAE UCN)
- Climate Champions
- Alliance of World Universities (U7+)
- Research and Independent Non-Governmental Organization Constituency (Ringo)
- International Sustainable Campus Network (ISCN)
- Second Nature (University Climate Change Coalition, UC3, Climate Leadership Network)
- Least Developed Countries University Consortium on Climate Change (Luccc)
- The Alliance for Sustainability Leadership in Education (Eauc)
- Global Alliance of Universities on Climate (Gauc)
- The UK Universities Climate Network (UUCN)
- Italian University network for Sustainable Development (RUS)
- Association of Commonwealth Universities (ACU)
- International Universities Climate Alliance (Iuca)
- UN Sustainable Development Solutions Network (SDSN)
- European Universities Association (EUA)
- Red Campus Sustentable (RED)
- Global Council for Science and the Environment (GCSE)
- Climate U
Parcerias para o HIDS
Também constou da agenda da comitiva da Unicamp na COP29 uma reunião com Anderson Marcio de Oliveira, secretário-executivo da Secretaria de Meio Ambiente, Infraestrutura e Logística (Semil) do Estado de São Paulo. Gabriela Celani, representante do HUB Internacional de Desenvolvimento Sustentável (HIDS), docente da Faculdade de Engenharia Civil, Arquitetura e Urbanismo (Fecfau) e pesquisadora responsável do Centro de Estudos sobre Urbanização para o Conhecimento e a Inovação (Ceuci), falou sobre a proposta de implantar um jardim filtrante-piloto próximo à margem do Ribeirão das Anhumas, na Fazenda Argentina, onde ficará o HIDS. A ideia consiste em bombear a água do Anhumas para um jardim com plantas aquáticas e depois retorná-la com melhor qualidade, contribuindo para o tratamento dos poluentes resultantes do esgoto lançado no ribeirão. “Esse exemplo de soluções baseadas na natureza [SBN] tem manutenção simples e poderá ser ampliada futuramente, inclusive para tratar as águas pluviais das ruas da Fazenda Argentina”, explicou.
Donato, por sua vez, apresentou o Projeto Estratégico dos Corredores Ecológicos, ressaltando a intenção de que os proprietários e as instituições do entorno da Unicamp se engajem em iniciativas de recuperação ambiental. “Trata-se de uma iniciativa muito alinhada aos objetivos da Semil. Podemos formatar um projeto para financiar ações de recuperação de áreas verdes e de nascentes por parte desses proprietários”, afirmou Oliveira, que deve visitar a Unicamp e o HIDS em breve. “A parceria com a Secretaria do Meio Ambiente representa um passo importante para consolidar um dos objetivos do HIDS: oferecer um modelo de soluções para o desenvolvimento sustentável que pode ser replicado em outras cidades do Estado de São Paulo e do Brasil”, disse Donato.