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Pessoa idosa segura aparelho celular

Tese investiga como padrão vocal pode indicar avanço do Parkinson

Pesquisador avalia se aspectos da fala de pessoas idosas podem ser biomarcadores da doença

Tese investiga como padrão vocal pode indicar avanço do Parkinson

Pessoa idosa segura aparelho celular

Pesquisador avalia se aspectos da fala de pessoas idosas podem ser biomarcadores da doença

A voz, um instrumento fundamental para quase todos os seres humanos, transmite emoções, revela intenções e faz parte da identidade da pessoa. No discurso, serve como uma ferramenta essencial para persuadir, contar histórias e compartilhar conhecimento. Do ponto de vista fisiobiológico, pode refletir a condição de saúde de um paciente ao revelar o estado da respiração, das pregas vocais e do controle neuromuscular, tornando-se um indicador importante para alguns diagnósticos.

Levando isso em conta, o pesquisador Lucas Manca Dal’Ava investigou em seu doutorado como diferentes características acústicas da fala podem servir como biomarcadores para a doença de Parkinson, um distúrbio neurológico crônico e progressivo que impacta desde o controle motor até questões cognitivas.

“Sabemos que a voz é um dos elementos afetados pelo Parkinson. Meu objetivo foi entender quais aspectos são mais relevantes e se eles podem ser usados como indicadores confiáveis”, explica Dal’Ava, que tem dupla titulação, em linguística e fonoaudiologia.

A ideia de estudar a fala como um possível marcador da doença partiu de uma inquietação: os sinais do Parkinson já aparecem na maneira como uma pessoa fala, mesmo antes de registrados clinicamente? O pesquisador se debruçou sobre 24 parâmetros vocais, desde a intensidade e a articulação até aspectos mais sutis da variação tonal, algo inédito na área.

No doutorado, realizado no Instituto de Estudos da Linguagem (IEL) da Unicamp sob orientação do professor Plinio Almeida Barbosa, Dal’Ava analisou a fala de 32 pessoas idosas, divididas entre indivíduos saudáveis – grupo controle – e pacientes nos estágios iniciais e intermediários do Parkinson – grupo experimental –, em busca de padrões que pudessem tanto diferenciar aqueles que têm dos que não têm o distúrbio assim como identificar o estágio da doença nos casos diagnosticados.

Os testes consistiram na leitura de um parágrafo curto, de 68 palavras, por parte da pessoa idosa, seguida de um comentário espontâneo a respeito desse trecho. Ambas as falas, gravadas, passaram por análises posteriores.

Segundo a literatura citada no doutorado, pesquisas na área focaram parâmetros específicos de qualidade vocal, como jitter (tremor) e shimmer (tremeluzir), explica Dal’Ava. Esses indicadores dizem respeito à estabilidade da vibração das pregas vocais e à variação na intensidade do som, respectivamente. Outras pesquisas trabalharam com poucos parâmetros, como as pausas na fala. Embora se mostrem fundamentais, tais estudos não fornecem um panorama completo.

O pesquisador Lucas Manca Dal’Ava: análise a partir de 24 parâmetros
O pesquisador Lucas Manca Dal’Ava: análise a partir de 24 parâmetros

“O ponto principal da tese é: sabemos que existem vários outros parâmetros e que podemos compará-los com o mesmo trecho de voz sob análise. Na tese, realizamos um cálculo do tamanho de efeito para indicar a relevância prática dos resultados.” A maioria dos parâmetros estudados contribuiu para identificar as pessoas idosas com e sem Parkinson, de acordo com os resultados apresentados. Ao avaliar quais poderiam identificar a progressão da doença, dois deles chamaram a atenção.

O pesquisador Lucas Manca Dal’Ava: análise a partir de 24 parâmetros
O pesquisador Lucas Manca Dal’Ava: análise a partir de 24 parâmetros

“Quando analisamos esses grupos, observamos que nem todos os parâmetros demonstraram uma progressão clara com o avanço da doença. Isso é um ponto crucial para nós, pois a consistência na progressão pode indicar um parâmetro potencial para identificar biomarcadores da doença de Parkinson”, explica.

“Os parâmetros que mais claramente acompanharam a progressão da doença foram a taxa de elocução, ou seja, o número de sílabas que a pessoa consegue produzir por segundo, e a taxa de articulação, que é a mesma medida, mas sem considerar as pausas. Esses indicadores mostraram-se particularmente sensíveis, piorando de forma consistente à medida que a doença avançava, o que os torna potenciais biomarcadores para monitorar a evolução do Parkinson.”

O estudo ainda revelou que testes de leitura mostraram-se mais eficazes para detectar a doença e seus estágios do que análises de falas espontâneas. “No ambiente clínico, para analisar a voz do paciente, pode-se gravar a leitura de um trecho escrito e a fala espontânea”, explica o pesquisador. Segundo Dal’Ava, a abordagem “foi consistente ao diferenciar quem tem ou não a doença ao identificar os estágios em homens e mulheres para determinados parâmetros prosódico-acústicos”.

A análise das vozes no estudo deu-se por meio de um processo técnico acessível, utilizando ferramentas conhecidas na área.

Desafios e soluções

Um acontecimento inesperado, a pandemia de covid-19, impôs desafios suplementares ao pesquisador, mas também revelou possibilidades que não estavam no horizonte da pesquisa inicialmente. Quando Dal’Ava começou o doutorado, várias pessoas idosas que deveriam participar da pesquisa desistiram por medo de se expor à doença, que até então era totalmente desconhecida. Para que o estudo não ficasse prejudicado, o pesquisador e seu orientador decidiram coletar as vozes dos participantes por meio de uma gravação feita em um aparelho de celular. Aqueles que aceitaram ir até o Centro de Estudos e Pesquisa em Reabilitação “Dr. Gabriel Porto” (Cepre), do curso de fonoaudiologia da Unicamp, tiveram suas vozes gravadas no celular do pesquisador por meio de um aplicativo gratuito, mesmo aplicativo usado pelos que aceitaram participar da pesquisa desde casa – esses receberam orientações por videochamada.

A alternativa mostrou-se viável, revelando que os profissionais da área não precisam de cabines especiais para gravar a voz a ser analisada.

Dal’Ava pretende avançar nessa mesma linha de pesquisa no pós-doutorado e focar determinados parâmetros. Com mais estudos como esse, o pesquisador acredita no desenvolvimento, em um futuro próximo, de um aplicativo que, aliado a técnicas de machine learning (aprendizado de máquina), poderá facilitar a análise dos parâmetros por parte dos profissionais de fonoaudiologia que tratam de doentes com o mal de Parkinson.

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