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Material auxilia na remoção de contaminantes

Membranas à base de polímeros com nanopartículas adsorventes retêm impurezas da água por meio de interações físico-químicas

Manipulação de membrana em laboratório da FT: feito com polímero sintético, material é enriquecido com derivado de óxido de grafeno
Manipulação de membrana em laboratório da FT: feito com polímero sintético, material é enriquecido com derivado de óxido de grafeno

Membranas à base de polímeros são materiais amplamente utilizados no tratamento de efluentes, resíduos resultantes de atividades produtivas devolvidos ao meio ambiente na forma de líquidos ou gases. Essas membranas funcionam como peneiras extremamente finas, que retêm os efluentes por meio de poros capazes de bloquear a passagem de partículas contaminantes. O desafio consiste em reter partículas contaminantes dissolvidas na água cada vez menores e diversas. Nesses casos, faz-se necessário agregar novas propriedades físico-químicas aos polímeros utilizados na produção das membranas de forma a potencializar a capacidade de remoção desses contaminantes.

“A maioria dos recursos convencionais usados para o tratamento da água não removem uma série de contaminantes. Para suprir a demanda necessária e conseguir remover esses contaminantes, é fundamental um material com poder de interação com essas substâncias”, explica Tauany Neves, doutora em tecnologia na área ambiental pela Faculdade de Tecnologia (FT) da Unicamp e criadora de uma nova membrana com esse potencial.

O material, feito com poliacrilonitrila (PAN), um polímero sintético, e enriquecido com um derivado de óxido de grafeno, um nanomaterial obtido pela oxidação do grafite, recebeu também safranina, um corante industrial. Graças às propriedades desses componentes, a membrana mostrou-se eficiente na remoção de contaminantes presentes na água, como corantes, fármacos e materiais tóxicos. O desenvolvimento da tecnologia, durante a pesquisa de doutorado de Neves, contou com orientação de Renato Falcão Dantas e coorientação de Patrícia Prediger, ambos docentes da FT.

Tauany Neves, autora da pesquisa de doutorado: alertando para o surgimento recorrente de novos compostos
Tauany Neves, autora da pesquisa de doutorado: alertando para o surgimento recorrente de novos compostos

Pureza por adsorção

A PAN é um dos polímeros utilizados na produção de membranas para descontaminação da água, juntamente com o fluoreto de polivinilideno (PVDF, na sigla em inglês) e o acetato de celulose. Trata-se de membranas comerciais cujo efeito descontaminante acontece por conta da barreira física oferecida pelo poros desses materiais. A PAN possui a vantagem de poder passar por um processo de modificação química responsável por agregar ao material a capacidade de atrair e reter moléculas de contaminantes em sua superfície por meio de interações químicas. Essa propriedade acentua-se quando a PAN é aplicada na produção de membranas e fibras pois sua superfície aumenta, ampliando a área de contato e de interação com outras moléculas.

Em busca de ampliar a capacidade adsorvente da membrana para além das propriedades da PAN, a pesquisadora procurou outros materiais adsorventes que pudessem ser incorporados ao polímero. E acabou por escolher o óxido de grafeno, um elemento altamente reativo. “O óxido de grafeno é um adsorvente dotado de propriedades físico-químicas que permitem a interação com uma variedade de compostos, como pesticidas, fármacos, corantes e metais”, descreve Prediger. Apesar de sua alta reatividade, os grupos oxigenados que o integram fazem com que o material seja aniônico, rico em elétrons, capaz de interagir com compostos catiônicos, com menor quantidade de elétrons. Para dar versatilidade ao adsorvente, permitindo que interagisse com contaminantes catiônicos e aniônicos, adicionou-se à sua estrutura o corante safranina, que é catiônico, tornando mais funcional o material.

A pesquisa resultou na produção de três membranas distintas, duas das quais obtidas pelo processo de mistura da PAN e dos aditivos adsorventes em um único solvente, resultando na membrana sólida. A terceira serviu-se da técnica layer by layer (em português, camada por camada), em que se depositam as camadas de cada um dos materiais em sequência, uma sobre a outra, de forma que a interação entre esses materiais torne a membrana uniforme. Neves executou essa técnica na Universidade de Aveiro (Portugal), durante um período de bolsa-sanduíche.

A fim de testar sua efetividade, as membranas passaram por ensaios de filtração e adsorção em batelada – quando a membrana é colocada na amostra de água e o recipiente passa por agitação. A pesquisadora comparou o desempenho purificante da membrana PAN e das versões modificadas. Os testes mostraram que as membranas modificadas usando o material com a safranina têm uma capacidade de purificação superior em comparação à membrana PAN e à membrana modificada somente com o óxido de grafeno.

Nos ensaios com alguns metais potencialmente tóxicos, o chumbo acabou inteiramente removido. A seguir, verificaram-se altos índices de filtragem do cromo e do cobre. Por fim, houve porcentagens menores de filtragem do cádmio e do níquel. Realizaram-se também testes com corantes, fármacos, surfactantes e retardantes de chamas, testes esses nos quais a membrana com óxido de grafeno obteve o melhor resultado. Segundo Neves e Prediger, o material pode ser reutilizado por até cinco ciclos de descontaminação sem que seu potencial se reduza.

A professora Patrícia Prediger, coorientadora do estudo: material pode ser reutilizado por até cinco ciclos de descontaminação
A professora Patrícia Prediger, coorientadora do estudo: material pode ser reutilizado por até cinco ciclos de descontaminação

Contaminantes emergentes

Aprimorar os métodos de tratamento de efluentes representa uma contribuição científica importante para a preservação do meio ambiente e para as próprias indústrias e outros setores produtivos. No Brasil, uma série de normas regem a responsabilidade pelo tratamento de efluentes. A principal delas, a resolução 430/2011 do Conselho Nacional do Meio Ambiente (Conama), determina que, visando eliminar ou neutralizar substâncias capazes de provocar danos ao meio ambiente, os efluentes oriundos de processos industriais devem passar por um tratamento antes de seu descarte em rios.

As pesquisadoras alertam para o risco dos chamados contaminantes emergentes, lançados na natureza sem que se conheça seus possíveis efeitos tóxicos. “Surgem novos compostos a cada dia”, alertou Neves. De acordo com a orientanda e a orientadora, oferecer às indústrias materiais de alto poder descontaminante, como no caso da nova membrana, representa uma forma de garantir que esses contaminantes não sejam descartados sem tratamento. “A tendência é que cada composto contaminante tenha uma regulação específica. Porém, até chegarmos a essas normas, muitos estudos são necessários”, advertiu Prediger.

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