Pesquisa da FCM foi desenvolvida junto a 274 mulheres
Um estudo recente da Unicamp associa a Síndrome da Bexiga Hiperativa, doença caracterizada pela urgência miccional, a quadros de depressão e ansiedade. Desenvolvida exclusivamente em mulheres, a pesquisa apontou que, de um total de 274 participantes, 59,8% (163 mulheres) tinham depressão grave ou moderada e 62,4% (211 mulheres) apresentaram sinais de ansiedade grave e moderada.
A pesquisa foi desenvolvida junto a mulheres com sintomas de bexiga hiperativa, mas sem diagnóstico prévio de depressão e ansiedade. Para a autora do trabalho, a terapeuta sexual Iane Glauce Ribeiro Melotti, os resultados apontam para a necessidade de uma abordagem integral para a saúde das mulheres.
“A abordagem dos aspectos psicológicos é importante no tratamento dos sintomas urinários, mas, muitas vezes, acaba sendo deixada de lado pelos profissionais da saúde. Escutar as queixas das mulheres, aprofundando o conhecimento de suas vivências, pode permitir uma melhor compreensão sobre o problema”, conclui a pesquisadora.
Iane Melotti ressalva que, com os resultados, não é possível afirmar se a depressão e a ansiedade seriam causas ou consequências da bexiga hiperativa em mulheres. Conforme a estudiosa, o trabalho apontou, exclusivamente, uma significativa correlação entre a síndrome e a intensidade dos transtornos mentais. Quanto maior a intensidade de uma dessas três doenças ou distúrbios, maior a correlação entre eles.
Outro resultado relevante apontado pelo estudo foi que a noctúria, marcada pela necessidade de se levantar durante a noite para urinar, foi um dos sintomas da Síndrome da Bexiga Hiperativa que mais se relacionou com a depressão e ansiedade grave. A chamada incontinência de urgência, perda involuntária da urina com sintomas de urgência, também foi outra manifestação da bexiga hiperativa relacionada aos quadros mais graves dos dois transtornos mentais.
“Esse tipo de problema urinário afeta substancialmente a qualidade de vida das mulheres. Em alguns casos, elas deixam de trabalhar, de sair ou de fazer uma viagem, por exemplo. Quanto mais graves e intensos os sintomas, mais a qualidade de vida da mulher é afetada, envolvendo as relações no trabalho, social, sexual e familiar. Muitas vezes, a mulher com a síndrome já sai de casa pensando se vai ter banheiro, se ela vai poder ir ao banheiro e em que momento isso vai ser possível”, exemplifica Iane Melotti.
O estudo desenvolvido por ela integrou tese de doutorado defendida em fevereiro de 2016 junto ao Programa de Pós-Graduação em Ciências da Cirurgia da Faculdade de Ciências Médicas (FCM) da Unicamp. O trabalho foi orientado por Cássio Luis Zanetini Riccetto, médico urologista e professor do Pós-Graduação em Ciências da Cirurgia da FCM. Houve coorientação de Cássia Raquel Teatin Juliato, ginecologista e docente do Departamento de Tocoginecologia da FCM.
As mulheres participantes do estudo foram atendidas no ambulatório de Urologia Feminina do Hospital de Clínicas (HC) da Unicamp e no ambulatório de Ginecologia Geral do Hospital da Mulher/ Caism Unicamp, entre março de 2012 e março de 2015. A Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes) financiou o estudo, com a concessão de bolsa à pesquisadora.
“O objetivo da pesquisa foi organizar evidências disponíveis na literatura acerca das correlações entre os sintomas de bexiga hiperativa, depressão e ansiedade na forma de uma revisão sistemática e correlacionar os níveis de depressão e ansiedade (mínima, leve, moderada ou grave) em mulheres com diagnóstico de bexiga hiperativa por meio de um estudo transversal envolvendo 274 mulheres”, explica Iane Melotti.
Conforme a autora do trabalho já existem outros estudos correlacionando a Síndrome da Bexiga Hiperativa a transtornos mentais. “Mas a maioria dos trabalhos associam ou a depressão ou a ansiedade à bexiga hiperativa; e também em conjunto com outros problemas, não somente com a síndrome. Outra caraterística do nosso estudo que o diferencia dos demais é que se trata de um trabalho especificamente em mulheres e que avaliou diferentes níveis de depressão e ansiedade”, compara.
Doença subdiagnosticada
Iane Melotti explica que a ocorrência da síndrome independe do nível social, econômico, educacional e da faixa etária. “A bexiga hiperativa é uma síndrome altamente prevalente na população feminina, muito mais do que em homens. Atinge mulheres jovens, adultas e idosas. No Brasil há estudos mostrando uma prevalência global em 18,9% das mulheres. Mas é uma doença subdiagnosticada, ou seja, muitas mulheres não procuram tratamento, por preconceito ou por acreditarem ser um processo normal e natural do organismo”, dimensiona.
Estima-se, no Brasil, que metade das mulheres que sofrem com a síndrome não busque tratamento adequado para o problema. A pesquisadora explica que, dependendo do diagnóstico, o tratamento pode envolver tanto o uso de medicamentos, exercícios fisioterápicos, cirurgia e terapia comportamental.
Critérios
Iane Melotti informa que os critérios de inclusão para a participação no estudo de corte transversal foram: mulheres com idade a partir de 18 anos; diagnóstico de bexiga hiperativa pelos critérios da International Continence Society; e compreensão e assinatura do termo de consentimento livre e esclarecido.
Foram excluídas do estudo mulheres com gravidez diagnosticada ou suspeitada, com lactação vigente, doenças sistêmicas, hipertensão arterial grave comprovada, coronariopatia ou cardiopatia incapacitante, desordens psiquiátricas primárias, tais como esquizofrenia e outras psicoses. Também foram excluídas mulheres em tratamento para bexiga hiperativa que estivessem fazendo uso de antidepressivos, ansiolíticos e diuréticos, além de condições cognitivas insuficientes para responder aos questionários.
A pesquisa foi aprovada pelo comitê de ética em pesquisa da Faculdade de Ciências Médicas (FCM) e pela Comissão de Pesquisa do Departamento de Tocoginecologia (DTG) do Caism.
Publicação
Tese: “Correlação de depressão, ansiedade e síndrome da bexiga hiperativa em mulheres: estudo transversal e revisão sistemática da literatura”
Autora: Iane Glauce Ribeiro Melotti
Orientador: Cássio Luis Zanetini Riccetto
Coorientadora: Cássia Raquel Teatin Juliato
Unidade: Faculdade de Ciências Médicas (FCM)
Financiamento: Capes