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Joyce Siqueira Silva (à esq.), autora do estudo, e a professora Juliana Azevedo Lima Pallone, orientadora: determinação dos teores de minerais
Joyce Siqueira Silva (à esq.), autora do estudo, e a professora Juliana Azevedo Lima Pallone, orientadora: determinação dos teores de minerais

Sabe-se da importância da ingestão de sais minerais para a manutenção funcional do organismo humano e preservação do seu equilíbrio.  Deles fazem parte, entre outros, o ferro (Fe), o cálcio (Ca), o magnésio (Mg) e o zinco (Zn). Estes elementos estão entre os mais importantes para a manutenção da saúde e sua carência constitui um dos maiores problemas de saúde pública no mundo.

Por paradoxal que possa parecer, três deles, Ca, Fe e Mg, significativamente presentes nos resíduos sólidos de frutas cítricas (bagaços), resultantes de processamentos industriais de laranjas e limões, têm como destino principalmente a ração animal. Vale lembrar que a citricultura é um dos setores mais importantes da agroindústria brasileira. A produção anual de laranjas e limões é superior a 19 milhões de toneladas – 30% da produção mundial, a maior parte (80%) destinada à extração de sucos.

Ocorre que aproximadamente 50% do peso da fruta dá origem ao bagaço, grande parte dele destinado à fabricação de ração depois de extraídos alguns subprodutos como óleos essenciais, D-limoneno, pectina, embora nele estejam presentes, além de sais minerais, fibras, proteínas, lipídios, vitaminas, compostos fenólicos, ácidos, pigmentos, açúcares, compostos voláteis.

Apesar desta riqueza o uso de resíduos de frutas cítricas na alimentação humana ainda é insignificante, mesmo com alguns estudos demonstrando o seu potencial na alimentação e outros avaliando a incorporação de farinhas de produtos cítricos entre os ingredientes de biscoitos e barras de cereais, por exemplo. Além de tudo, são escassos os trabalhos em relação aos minerais presentes no bagaço e não foram relatados estudos a respeito da sua bioacessibilidade, que é uma simulação in vitro do que acontece durante o processo digestivo no organismo em relação à absorção. O aproveitamento desses resíduos na alimentação humana, além de agregar valor ao produto, contribuiria para adição em alimentos de nutrientes necessários à saúde.

Este quadro levou a engenheira de alimentos Joyce Grazielle Siqueira Silva a desenvolver pesquisa em que avalia o potencial de minerais em resíduo de frutas cítricas e faz uma estimativa da bioacessibilidade de Ca, Fe e Mg. A parte experimental da dissertação foi realizada no Laboratório de Análise de Alimentos, dirigido pela professora Juliana Azevedo Lima Pallone, do Departamento de Ciência de Alimentos da Faculdade de Engenharia de Alimentos (FEA) da Unicamp, que a orientou.

A autora considera que o estudo, financiado pelo CNPq e pela Capes, contribui para determinação dos teores de minerais de importância para a saúde em resíduos de citrus, para avalição das frações bioacessíveis dos mesmos e para o fornecimento de parâmetros que possam vir a colaborar para a utilização do bagaço como ingrediente alimentar.

Caminhos
Para a viabilização dessas contribuições, a primeira parte do trabalho concentrou-se no desenvolvimento de uma metodologia que garantisse validade e acurácia do processo analítico proposto. Isso foi feito em relação aos elementos de maior interesse (Ca, Fe, Mg e Zn), com base em amostras de resíduos secos de laranja pera, laranja hamlin, limão taiti e limão siciliano, doadas por empresa e provenientes de colheitas de diferentes épocas do ano.

Nesta fase foram investigadas as composições desses nutrientes nas duas variedades de laranjas e limões e quantificadas as participações desses minerais durante os vários períodos de safra dos cultivares avaliados e, ainda, da mistura das espécies pera, hamlin e taiti, utilizando a espectroscopia de absorção atômica com chama.  Nesta etapa, o planejamento experimental mostrou-se adequado para a otimização da mineralização (eliminação dos componentes orgânicos do bagaço) bem como a validação dos parâmetros que devem ser obedecidos para a determinação dos minerais em amostras secas de bagaço dos diferentes tipos de citrus.

A satisfação das pesquisadoras foi muito grande diante dos altos teores de Ca, Fe e Mg observados. Uma porção de 100g de resíduo seco fornece, respectivamente, 68%, 35%, 83% e 10% da ingestão diária recomendada de Ca, Fe, Mg e Zn, o que torna os resíduos de citrus fonte particularmente importante de Ca, Fe e Mg, elementos adicionados muitas vezes pelas indústrias na forma de sais inorgânicos, para enriquecimento dos alimentos.

Já para a avaliação da bioacessibilidade foi feita a simulação em laboratório do que acontece no processo digestivo, reproduzindo as condições do estômago e do intestino em termos de pH, presença de enzimas e temperatura, com vistas a saber que quantidades dos quatro elementos quantificados no bagaço se transferem dele para a fase líquida durante o processo gastrointestinal.

É na forma solúvel que os elementos se credenciam a serem absorvidos pelo organismo, já que os que permanecem na fase sólida provavelmente serão eliminados através do bolo fecal.  Os resultados encontrados mostraram que Ca, Fe e Mg têm grande potencialidade de serem absorvidos pelo organismo. Mas restava saber em que proporção isso efetivamente acontece.

Para tanto, o mesmo processo foi repetido, mas agora com a adição de um saco de diálise, polímero com poros equivalentes aos que existem no intestino, cheios de solução de bicarbonato de sódio, para simular as condições do órgão em que ocorre a maior parte da absorção de nutrientes pelo organismo. A diferença entre as quantidades desses elementos presentes na fase líquida da digestão antes da diálise e depois dela indica a quantidade de mineral que pode ser absorvida pelo organismo. Ou seja, na solubilidade é determinada a fração de mineral solúvel, enquanto na diálise é medida a fração do mineral que atravessou o saco de diálise. Como era de se esperar, o porcentual de diálise foi menor que o porcentual de solubilidade para a mesma amostra de bagaço.

As condições in vitro fornecem, naturalmente, uma estimativa do que o organismo poderia absorver dos minerais presentes inicialmente no resíduo seco dos cítricos considerados. Os resultados mostraram que a bioacessibilidade de alguns minerais pode ser afetada por outros componentes dos alimentos, como as fibras insolúveis. Em decorrência, os minerais tiveram diferentes percentuais de bioacessilidade em decorrência das interações a que estavam sujeitos no resíduo. O Mg foi o elemento mais bioacessível, vindo a seguir o Fe e depois, em grau menor, o Ca.

Resultados
Os dados mostram que os resíduos cítricos de laranjas e limões têm altas concentrações principalmente de Ca, Mg e Fe, podendo constituir fonte para a ingestão diária desses elementos preconizada pelos organismos de saúde, e que Mg e Fe se mostram muito acessíveis ao organismo. Em decorrência, um resíduo de baixo custo, usado comumente na produção de ração animal, tem possiblidade de ser adicionado à alimentação humana, recurso importante quando se sabe que a carência de Ca, Mg e Fe é ainda considerada problema de saúde pública.

Os resíduos cítricos podem vir a ser utilizados em formulações industriais de bolos, sorvetes, barras de cereais, contribuindo não apenas com as funções tecnológicas relacionadas a esses produtos mas, também, para melhorar o sabor desses alimentos, enriquecendo-os ainda.

Publicação

Dissertação: “Potencial de minerais em resíduo de frutas cítricas e estimativa da bioacessibilidade de cálcio, ferro e magnésio”
Autora: Joyce Grazielle Siqueira Silva
Orientadora: Juliana Azevedo Lima Pallone
Unidade: Faculdade de Engenharia de Alimentos (FEA)
Financiamento: CNPq e Capes

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