“Temos R$ 1.200 per capita no Brasil para fazer a atenção integral a toda população, mas na verdade dependem mesmo do SUS [Sistema Único de Saúde] 75% das pessoas. Outras 25%, provindas da classe média e alta, têm convênios e recorrem aos serviços privados em suas necessidades de saúde. Infelizmente os recursos do SUS são poucos e então esse é um grande problema a ser equacionado”, comentou o sanitarista da Unicamp Gastão Vagner, ao falar de políticas públicas de saúde durante o Fórum “Políticas públicas socialmente compromissadas, vidas despatologizadas”, realizado no auditório do Instituto de Economia (IA) no último dia 29.
Segundo o médico, que já foi secretário municipal de saúde de Campinas por dois anos e é professor do Departamento de Saúde Coletiva da Faculdade de Ciências Médicas (FCM), o centro da política pública do Brasil hoje é o SUS, porém esse sistema tem alguns gargalos, sendo o principal e mais crônico, desde a década de 1990, o subfinanciamento. Outro problema, apontou, foi que o SUS se estruturou de modo fragmentado. Logo, há vários SUS a serem geridos (o SUS estadual, o SUS federal e o SUS municipal) e tem ainda a privatização. “Na área hospitalar, dependemos muito da compra de serviços. Ocorre que a governabilidade do SUS sobre essa rede de serviços, particularmente a de maior complexidade, é mínima”, admitiu.
O sanitarista explicou que o SUS também está sendo sufocado crônica e gradativamente com a falta de recursos e com o orçamento. “Com isso, os hospitais públicos, nos últimos três anos, têm diminuído o número de leitos e fechado atendimento em todo país. Brasileiros, que teriam alternativa de tratamento, já estão morrendo”, contextualizou. Apesar disso, Gastão acredita que o SUS é indispensável, mesmo com muitos problemas, com muitas filas, sem humanização e com discursos contrários. “Os obstáculos não significam que o SUS vai acabar. Pelo contrário: ele veio de fato para ficar”, ressaltou.
Ao lado de Gastão no evento, estava o educador da Unicamp Luiz Carlos de Freitas. Ambos participaram da conferência “Políticas públicas de saúde e educação: riscos e desafios”, cada qual abordando os desafios em suas áreas: saúde e educação. Se para Gastão acabar com o SUS não seria a solução, mesmo porque ele entende que esse sistema é de grande importância para os brasileiros, para o ex-diretor da Faculdade de Educação (FE) “cada vez mais devemos juntar esforços contra os processos de privatização que, aplicados em outros países, levou crianças ao adoecimento, à antecipação da escolarização na educação infantil, provocando inúmeras distorções no processo educativo e na saúde”.
Conforme o educador, primeiro adoecem as crianças e depois os próprios pais, pelo massacre que essas propostas trazem em termos de processos de avaliação e de permanente tensão, para não falar do adoecimento dos professores. “Estas propostas são perversas e destroem os principais atores da escola. O Brasil terá que enfrentar essa realidade, que já se desenha há algum tempo. Para esse enfrentamento, a intensidade deverá ser outra”, lamentou. “Tem-se manifestado um grande assédio empresarial para introduzir suas ideologias, isso do ensino infantil até a universidade”, concluiu.
A pediatra Aparecida Moysés, uma das organizadoras do Fórum, informou que nesse ano foi priorizada ainda mais a discussão das políticas públicas comprometidas com a qualidade de vida e com o bem-estar de todas as pessoas. “As políticas públicas estão sofrendo um ataque violento e portanto esse é um bom momento para discutir esses aspecto, pois elas são fundamentais quando se fala em direitos e conquistas”, frisou. Júlio Hadler, coordenador do Penses, apresentou ao público os cinco primeiros volumes da série de fóruns promovidos pelo órgão. O evento foi organizado pelo Fórum Pensamento Estratégico (Penses) e pelo Despatologiza – Movimento pela Despatologização da Vida.