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Pesquisa do IB prolonga a vida de verme em 20% ao inibir proteína presente também no organismo humano

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A ciência ainda está longe de descobrir a fonte da eterna juventude, mas tem obtido cada vez mais evidências de que pode controlar, em algum grau, o processo de envelhecimento. Pesquisadores do Instituto de Biologia (IB) da Unicamp constataram, por meio de estudo em modelo animal, que é possível ampliar a longevidade inibindo uma proteína presente em vários organismos, inclusive o humano. Ao ser silenciada, essa proteína parece mimetizar a restrição calórica, processo conhecido por aumentar o tempo de vida de diferentes espécies. A investigação rendeu artigo publicado recentemente no periódico internacional BMC Biology.

A pesquisa foi desenvolvida no Laboratório de Biologia do Envelhecimento (LaBE) do IB, que é coordenado pelo professor Marcelo A. Mori. O trabalho contou com a participação de seis orientandos de pós-graduação do docente e com a colaboração de pesquisadores da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp), onde a pesquisa teve início. De acordo com Mori, o estudo se concentrou na função da proteína denominada IMPACT, que está presente em diversos organismos, desde leveduras e camundongos até seres humanos. Evidências científicas apontam que a IMPACT contribui para limitar o tempo de vida dos animais. Além disso, ela participa do processo de inibição de outra proteína, a GCN2.

A GCN2, explica Mori, reconhece e sinaliza para as células o nível de aminoácidos presentes no organismo. Em condições de nível elevado de aminoácidos, a proteína permanece inibida. Quando ocorre restrição de aminoácidos, ela fica ativada. “Ao nível celular, quando a GCN2 está ativada ela dispara a resposta antiestresse da célula, preservando-a de danos. No nível do organismo, essa proteína também participa da resposta antiestresse. O que nós fizemos foi investigar a relação entre as duas proteínas, tendo como foco o controle do envelhecimento”, afirma.

Segundo Mori, a ativação da resposta ao estresse torna o organismo mais resiliente, ampliando consequentemente o seu tempo de vida. “Dito de maneira simplificada, o que nós fizemos foi verificar inicialmente de que forma a proteína IMPACT participava do controle da GCN2. Em seguida, nós desenvolvemos métodos para inibir a primeira como forma de ativar a segunda e, assim, retardar o processo de envelhecimento”, pormenoriza o docente do IB. Para isso, os pesquisadores utilizaram um nematoide chamado C. elegans.

Apesar de pouco utilizado por grupos brasileiros, esse verme é bem conhecido pela ciência, dado que tem servido de modelo para diversas pesquisas. Entre elas, as investigações que identificaram os primeiros genes associados ao envelhecimento e o mecanismo de morte celular programada, essencial para o desenvolvimento de qualquer ser vivo. O pesquisador ressalta que o modelo é interessante para a formação de novos cientistas, devido a sua simplicidade e fácil manipulação. Embora tenha somente 1 milímetro de tamanho, esse organismo envelhece de forma semelhante ao ser humano, conforme Mori.

Quando está jovem, a C. elegans é muito ativa e se reproduz facilmente. À medida que envelhece, entretanto, ela deixa de se reproduzir, reduz a atividade e morre. “Como esse verme tem uma expectativa de vida de somente 20 dias, em média, isso facilita o estudo do envelhecimento em laboratório, pois podemos obter respostas rápidas e precisas às nossas perguntas”, esclarece Mori. “Nos testes que fizemos, constatamos que ao silenciarmos a IMPACT, nós ativamos a GCN2. Com isso, conseguimos estender a vida da C. elegans em 20%, o que representa um ganho muito significativo”, acrescenta o professor.

Para silenciar a IMPACT, os pesquisadores lançaram mão de duas técnicas. Uma delas é a inativação gênica, que consiste em submeter um conjunto de vermes a um agente mutagênico e selecionar os mutantes de acordo com os genes de interesse. “No caso, nós obtivemos os animais diretamente de um banco de mutantes”, destaca Mori. O segundo método é o silenciamento gênico. Nesse caso, os cientistas introduzem um RNA dupla fita na bactéria que serve de alimento à C. elegans, que cumpre a função de se ligar ao RNA mensageiro alvo e promover a degradação deste.

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Conforme o docente do IB, há diferenças significativas entre as duas técnicas, visto que elas atuam por vias distintas, mas o dado fundamental é que ambas resultam no aumento da expectativa de vida do verme. “É importante reforçar que o silenciamento da IMPACT retarda o envelhecimento por uma via semelhante à da restrição calórica. Esse efeito da restrição calórica é bastante conhecido pelos cientistas e vem sendo estudado em diferentes organismos, desde fungos até primatas. Outro ponto relevante é que as duas intervenções podem ser complementares. Somadas, a restrição calórica e inibição da IMPACT fazem com que a C. elegans viva ainda mais”.

A principal conclusão da pesquisa, portanto, é que existe uma proteína que está presente em humanos e que, ao ser silenciada, leva à ativação e uma via que mimetiza os efeitos da restrição calórica e, como consequência, aumenta a expectativa de vida. Esse conhecimento é importante porque a restrição calórica não é um procedimento que possa ser prescrito de forma indiscriminada, visto que objetiva reduzir a ingesta alimentar em índices próximos a 40% pelo resto da vida. “Embora esse método amplie a longevidade, ele também pode causar efeitos deletérios, como interferir na capacidade reprodutiva e causar depressão”, alerta Mori.

O próximo passo da pesquisa, acredita o docente do IB, é verificar se os resultados obtidos até aqui podem ser repetidos com mamíferos. Isso já está sendo feito em colaboração com a professora Beatriz Castilho, da Unifesp. O laboratório da docente dispõe de um camundongo com características necessárias à investigação. O objetivo dos pesquisadores é também estudar essas proteínas sob o ponto de vista farmacológico. O que está no horizonte é o desenvolvimento de fármacos que possam contribuir para aumentar o tempo de vida com mais saúde dos seres humanos.

Um exemplo de fármaco que pode vir a ser utilizado nesse sentido é a metformina, um antidiabético comercial. Estudos em modelo animal demonstraram que o medicamento prolonga a vida. “Também há evidências de que diabéticos que tomam metformina vivem mais que diabéticos que tomam outro tipo de medicamento. Temos informações de que um estudo clínico está para ser iniciado para verificar se a droga pode ser utilizada no combate ao envelhecimento”, revela Mori.

Esse tipo de investigação vem ganhando relevância em todo o mundo, salienta o docente do IB, devido ao progressivo envelhecimento da população. O fenômeno, lembra, traz impactos econômicos e sociais importantes para os países, pois normalmente sobrecarrega os sistemas nacionais de saúde e previdência social, inclusive no Brasil. Projeções feitas pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), por exemplo, apontam que o número de brasileiros com 60 anos ou mais passará de 19,6 milhões para 66,6 milhões entre 2010 e 2050 (aumento de 239%).

Os estudos na área da Biologia do Envelhecimento, segundo Mori, tiveram início há pouco mais de duas décadas. Até então, acreditava-se amplamente que o envelhecimento era inevitável e que não poderia ser controlado. “Decorridos esses anos, hoje já sabemos que podemos controlar o envelhecimento em alguma medida. Os estudos que desenvolvemos aqui no IB estão em sintonia com que é feito no restante do mundo. Mantemos um diálogo muito produtivo tanto com grupos de pesquisas no Brasil quanto no exterior, assim como valorizamos a interdisciplinaridade em nossas investigações. Não é possível buscar respostas para um tema tão complexo quanto o envelhecimento em apenas uma área do conhecimento”, pontua Mori.

Além de impulsionar a pesquisa, essa cooperação com cientistas de outras áreas e países também confere maior qualidade à formação de recursos humanos, que é a função primordial da Universidade. “Eu achei fantástico ter tido a oportunidade de participar da pesquisa, principalmente porque pude trabalhar com um modelo que me possibilitou respostas mais rápidas e precisas. O trabalho também foi interessante porque envolveu vários aspectos e áreas. A discussão entre os estudantes e entre os grupos de pesquisa foi muito enriquecedora. A chance de publicar um artigo numa revista de alto impacto foi outro fator muito estimulante”, destaca Henrique Camara, mestrando e um dos autores do trabalho publicado na BMC Biology. As pesquisas desenvolvidas no LaBE contam com financiamento da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp) e Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq), além da colaboração da Unifesp.

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