A vida, a obra e as lutas da matemática, estatística e demógrafa Elza Berquó, que comemora seu aniversário de 100 anos nesta sexta-feira (17 de outubro), foram celebradas nesta quinta-feira (16) no Núcleo de Estudo de População (Nepo) da Unicamp, fundado por ela em 1982 e que, em 2014, passou a levar seu nome. A cientista social, antropóloga e demógrafa Gláucia Marcondes, que assumiu a coordenadoria do Nepo após 30 anos de atuação no Núcleo, destacou a importância do ciclo de homenagens. “É um ciclo de recuperação de memória, de reconhecimento das muitas lutas travadas por Elza.”

Na sexta-feira (10), o Centro Brasileiro de Análise e Planejamento (Cebrap), outra instituição criada por Berquó, teve a honra de recebê-la para uma homenagem em São Paulo. “Ao final, ela agradeceu, estava emocionada, fez uma fala lúcida, com muito afeto”, relata Marcondes. Na cerimônia na Unicamp, a demógrafa não pôde comparecer, mas o site dedicado a sua vida e obra, lançado pelo Nepo, foi entregue como presente de aniversário. “Elza lerá as mensagens e verá os depoimentos em vídeo. Acrescentamos ao projeto a seção ‘Nas Palavras de Elza’, com seus discursos proferidos na Unicamp”, contou Marcondes.
Uma das responsáveis por fundar e liderar espaços institucionais para o desenvolvimento da Demografia no Brasil, Berquó também esteve à frente da criação da Associação Brasileira de Estudos Populacionais (Abep), que anunciou no evento o lançamento da biblioteca virtual Elza Berquó, que reúne textos e estudos. “Nos somamos a essa onda de homenagens. Pensar em uma homenagem é pensar em seu legado”, destaca Luciana Lima, presidente da Abep.
No evento no Nepo, uma série de depoimentos reuniu convidados, presenciais ou virtuais, que conviveram, aprenderam e trabalharam com Berquó. Entre eles, em participação online, esteve Richarlls Martins, atual presidente da Comissão Nacional de População e Desenvolvimento (CNPD). “Ela foi a primeira presidente dessa comissão, entre os anos de 1995 e 2004, e fez uma importante contribuição para a legislação sobre planejamento familiar, além de ter feito toda a diferença na diplomacia em saúde”, afirmou.

A psicóloga e pesquisadora Margareth Arilha, que conviveu e trabalhou com Berquó, destacou que a demógrafa “sempre foi uma mulher que cuidou”. “Ela falava dos dados com poesia, criava redes, não virtuais, de ideias e saberes.” Por falar em poesia, a socióloga Carmem Barroso, que mora nos Estados Unidos, apresentou o poema “Elza Centenária” e recordou seu relacionamento com a demógrafa. “Sua maior lição foi nos ensinar a ocupar o espaço público.” Já Sandra Garcia, pesquisadora do Cebrap, abordou a preocupação de Berquó com a juventude. “Mesmo com quase 90 anos, Elza se mantinha inquieta e preocupada com os jovens.” Marta Cristina Teixeira Duarte, coordenadora adjunta da Coordenadoria de Centros e Núcleos Interdisciplinares de Pesquisa (Cocen), enfatizou o pioneirismo de Berquó e do Nepo, o primeiro centro de pesquisa da Unicamp. “Ela abraçou muitas causas.”
A médica sanitarista Tânia Lago, por sua vez, reforçou os ensinamentos que recebeu de Berquó, principalmente na questão dos direitos reprodutivos das mulheres. “A Elza usava os dados para mostrar como a realidade pode indicar para onde as políticas públicas devem seguir. Trouxemos esse conteúdo para as escolas médicas. Ela ampliou os horizontes dos operadores da área de saúde.”




A demógrafa e antropóloga Marta Azevedo, pioneira em identificar o fenômeno da recuperação populacional entre indígenas brasileiros, presidente da Fundação Nacional do Índio (Funai) entre 2012 e 2013, apresentou, em seu depoimento online, a influência de Berquó em seu trabalho. “Recorri ao Nepo quando, em 1991, os indígenas me disseram que o IBGE [Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística] não tinha subido às aldeias, e pensamos em um censo autônomo. Eu me tornei aluna, o trabalho evoluiu, a doutora Elza abriu o primeiro comitê de população indígena, e, devagar, evoluímos”, relatou.
“Fui acolhida no Nepo, tive essa grande sorte na vida. Foi uma vivência absolutamente fundamental, e fico com essa gratidão e essa marca de nunca colocar uma pesquisa com uma pergunta que seja distante da realidade ou que seja enviesada. A honestidade científica é outra grande lição que recebi da doutora Elza”, completa.
No evento, a indigenista adiantou que, no próximo dia 24, o IBGE divulgará, na Unicamp, os resultados do “Censo Demográfico 2022: Etnias e Línguas Indígenas – Principais Características sociodemográficas – Resultados do universo”, que atualizará o retrato da diversidade étnico-linguística dos povos indígenas residentes no Brasil e apresentará um conjunto de informações sociodemográficas das diferentes etnias, povos e grupos indígenas identificados. “Devemos muito a ela. Esse censo de etnias e línguas indígenas de 2022 deve muito a Elza Berquó”, completou.
Foto de capa:

Assista ao ciclo de homenagens organizado pelo Nepo:
