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Cultura e Sociedade Pesquisa

Projeto aborda experiências de estudantes de escolas públicas no espaço urbano de Campinas

Treze bolsistas já desenvolveram atividades tendo como resultado dois artigos publicados em periódicos científicos e outros dois textos em anais de eventos

O Ateliê de Pesquisas e Práticas em Ensino de Geografia (Apegeo), localizado no Instituto de Geociências (IG) da Unicamp, sedia o projeto Viver a Cidade: A Construção do Raciocínio Geográfico a Partir das Experiências Urbanas de Jovens do Ensino Médio, ligado ao Programa Institucional de Bolsas de Iniciação Científica para o Ensino Médio (Pibic-EM), do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq). Na Universidade, esse programa busca despertar a vocação científica e incentivar talentos potenciais entre os estudantes do ensino médio da rede pública de Campinas e região mediante a realização de atividades de pesquisa científica, sob a orientação de professores e pesquisadores.

De acordo com Rafael Straforini, docente do Departamento de Geografia do IG e coordenador do Apegeo, o projeto desenvolvido no instituto “é um guarda-chuva que estabelece uma relação muito direta entre a juventude e a cidade na perspectiva de entendermos os jovens, suas vivências e suas práticas no ambiente urbano, na cidade, na região metropolitana de Campinas. Entendendo que a cidade é um tema complexo e que a juventude vivencia e experiencia a cidade de diferentes formas, criamos um projeto para entender essas práticas espaciais juvenis em uma lógica geográfica”, disse.

O coordenador da Apegeo Rafael Straforini (ao centro) com o grupo de monitores do projeto Viver a Cidade
O coordenador da Apegeo Rafael Straforini (ao centro) com o grupo de monitores do projeto Viver a Cidade

O grupo trabalha, de uma perspectiva metodológica, adotando o ensino por investigação e aprendizagem baseado na resolução de problemas, ou problem-based learning (PBL). A metodologia aplicada deriva da demanda trazida pelos estudantes do ensino médio. “Os alunos do ensino médio são instigados a partir da metodologia do PBL e do ensino por investigação. Eles definem uma questão-problema que envolva suas práticas espaciais no viver a cidade, algo que seja importante, significativo, e que eles estejam querendo estudar ou compreender de forma mais aprofundada”, explica Straforini. 

No total, 13 bolsistas de escolas públicas já passaram pelo projeto no IG. Nos dois primeiros anos, houve apenas meninas bolsistas. As questões-problema elaboradas por elas, então, trataram de temas envolvendo diretamente a vida das mulheres, como a gravidez na adolescência e a violência contra a mulher. Os projetos debatem os assuntos de forma dialógica, abarcando todos os participantes: as bolsistas, os monitores e o coordenador, com o objetivo final de compreender tais questões-problema a partir da sua manifestação espacial ou geográfica na cidade de Campinas.

Raquel Mendes, uma das monitoras do projeto e que está em estágio doutoral na Universidade Estadual de Nova Jersey (Estados Unidos), sob supervisão da professora Priscila Ferreira, lembra ser “preciso ouvir sempre os bolsistas, sempre se colocando no lugar de ouvir e refletir. Nunca de julgamento, porque esses são temas sensíveis que envolvem, de alguma forma, uma camada moral, uma camada de julgamento. São camadas que vão tensionando a existência das meninas”.

Esses temas são vivenciados por meninas jovens como um todo, mas não há uma homogeneidade. “Quais são as diferenciações espaciais dessas experiências, dessas temáticas como a gravidez na adolescência e a violência sofrida pela mulheres? A cidade não experiencia isso da mesma forma. E aí a gente colocava sempre essas temáticas, não no campo dessas camadas de moral, mas no campo da camada social, dos condicionantes socioeconômicos, tentando entender como esses processos que elas trouxeram como temas refletem uma estrutura socioespacial que é desigual na cidade”, complementou.

Nos quatro editais que selecionaram o Apegeo para sediar o Pibic, seis monitores passaram pelo projeto:  Igor Cauê Vieira de Oliveira Pinto (2020 a 2023), Renan Pessina Gonçalves de Lima (2020 a 2023), Mendes (2022 e 2023), Luciano Martins da Rosa (2021), Jessica da Silva Rodrigues Cecim (2020 e 2021), Bruno Sobral Barrozo (2024) e Gabriel de Souza Toledo (2024). A formação desses monitores é também um dos objetivos do projeto desenvolvido no IG, uma vez que os coloca no lugar de orientador de uma pesquisa científica. Straforini lembra que atuou diretamente no primeiro projeto, em 2020, dando toda a formação inicial aos monitores sobre essas metodologias ativas de ensino: o ensino por projeto e o PBL.

A partir de certo momento, o docente do IG passou a compartilhar as responsabilidades com os monitores, pois acredita que seu papel também está na formação desses monitores para a vida acadêmico-científica. “Há um processo dos monitores também se apropriarem dessas etapas extremamente importantes da pesquisa e da orientação, do processo de se preparar para ser um professor, pesquisador, acadêmico”, explica.

Mendes lembra o fato de os monitores serem orientadores dos bolsistas. “Esse projeto nos permite, ainda que estejamos em nossos cursos de mestrado e doutorado, experienciar o papel de orientador de pesquisa. Esse lugar de acompanhar desde o início a construção de uma problemática, a reflexão em torno de um recorte espacial, em torno de um recorte metodológico, acompanhar o avanço dos processos, por exemplo, de escrita acadêmica, de reflexão metodológica, reflexão teórica – é muito importante para nós pós-graduandos”, explica. “Às vezes a gente tem que parar para pensar sobre o caminho que vamos tomar com as alunas e os alunos bolsistas do Pibic-EM, porque como a metodologia do PBL traz a prerrogativa de se trabalhar com a realidade do jovem, muitas das vezes nós somos interpelados por uma realidade que não está tão próxima da gente.”

Lima, também monitor do projeto, analisou em seu mestrado a reforma do ensino médio. Ele já havia estudado o Pibic-EM em sua iniciação científica, com bolsa da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp), e também em seu trabalho de conclusão de curso. “Por meio do PBL, tentamos fazer com que os bolsistas olhem para o cotidiano deles, para a cidade em que vivem, e vejam coisas com as quais não concordam, que incomodam, para que a gente consiga pesquisar algo que, de fato, os incomode. Minha parte é mais essa, de trazer essa problematização da cidade que elas e eles vivem.”

Igor Pinto, monitor do programa desde 2020 e que trabalha com tratamento de dados e confecção de mapas em seu mestrado, oferece aos bolsistas a possibilidade de lidar com programas de análise de informações geoespaciais e de encontrar dados e analisá-los. “Eu, particularmente, me especializo em geografia da educação, em que fazemos tratamentos de dados, de fenômenos educacionais, que geralmente são mais técnicos. Então, eu faço essa interface de pegar esses dados complexos e tentar trazê-los de uma forma um pouco mais simples, sobretudo da visualização cartográfica dessas informações no espaço”, explicou. Já Barrozo, que começou a atuar como monitor em 2024, diz estar aprendendo a orientar junto com os demais monitores.

Mapa das escolas com estudantes no projeto de Pibic-EM do laboratório Apegeo

Marina Lima foi bolsista do projeto Viver a Cidade em 2022 e 2023. Ela explica que participou ativamente das atividades propostas pelos monitores para chegar à escolha do tema do projeto, que buscou entender como o período pandêmico impactou espacialmente os casos de transtornos mentais entre jovens do município de Campinas. “Tínhamos acabado de sair do período pandêmico, então sabíamos como isso tinha impactado nos casos de transtornos mentais, como ansiedade e depressão. Assistimos a documentários, fizemos cartografias, mapeamos quais eram as regiões da cidade de Campinas que tinham mais casos de transtornos mentais. E eram todos casos subnotificados, porque a gente sabia que nem todas as pessoas, nem todos os adolescentes buscaram ajuda. Por fim, montamos nosso relatório”, disse.

Durante o projeto, Marina Lima aprendeu a ler textos acadêmicos, revisar literatura, fazer fichamentos, fazer referências segundo o padrão da Associação Brasileira de Normas Técnicas (ABNT). Para a estudante, que vinha pelo menos duas vezes por mês à Unicamp, o contato com a vida universitária antes mesmo da graduação despertou o interesse pela instituição. A ex-bolsista foi uma das alunas selecionadas para o Programa de Formação Interdisciplinar Superior (Profis), um curso de ensino superior da Unicamp voltado aos estudantes de ensino médio de escolas públicas de Campinas.

O grupo de monitores do projeto já conseguiu publicar dois trabalhos completos em anais de eventos, com autoria das alunas bolsistas do ensino médio, e dois artigos em periódicos científicos: um em uma revista específica de educação da Universidade Federal de Santa Maria, a Geografia, Ensino e Pesquisa, e outro na Revista Brasileira de Educação e Geografia. (confira abaixo)

Temas dos PBL desenvolvidos nos projetos:

A mulher na cidade: uso do território urbano por corpos femininos e jovens (edital 2020/2021)

O impacto da pandemia na vida das mulheres: a distribuição da violência no município de Campinas (edital 2021/2022)

O impacto da pandemia na vida de jovens adolescentes: a espacialização dos transtornos mentais no município de Campinas-SP (edital 2022/2023)

O novo ensino médio em primeira pessoa: considerações acerca do cotidiano escolar de/por jovens campineiros (edital 2023/2024)

Artigos publicados

PINTO, Igor Cauê Vieira de Oliveira; LIMA, Renan Pessina Gonçalves de; MENDES, Raquel Almeida. Ensino de Cartografia e aprendizagem baseada em problemas: a construção de pesquisas em Geografia no âmbito do PIBIC – Ensino Médio. Revista Brasileira de Educação em Geografia, [S. l.], v. 14, n. 24, p. 05–31, 2024. DOI: 10.46789/edugeo.v14i24.1322. Disponível em: https://www.revistaedugeo.com.br/revistaedugeo/article/view/1322. Acesso em: 22 out. 2024;

LIMA, Renan Pessina Gonçalves de; PINTO, Igor Cauê Vieira de Oliveira; CECIM, Jessica da Silva Rodrigues; STRAFORINI, Rafael. Iniciação científica com ensino médio: a aprendizagem baseada em problemas como forma de investigação geográfica. Geografia Ensino e Pesquisa, [S. l.], v. 26, p. e22, 2022. DOI: 10.5902/2236499467519. Disponível em: https://periodicos.ufsm.br/geografia/article/view/67519. Acesso em: 22 out. 2024;

SOUZA Rebeca Cristina de; AFONSO, Bárbara Lino; SOUZA; Hadassa Castro de; PINTO; Igor Cauê Vieira de Oliveira. O Impacto da Pandemia na Vida das Mulheres: a distribuição da violência de gênero no município de Campinas. In: Anais do 8º Encontro Regional de Ensino de Geografia: Linguagens, formação docente e práticas educativas no ensino de geografia. Universidade Estadual de Campinas, 2023;

MATOS, Laura Cristina; SOARES, Lavínia Laísa; COSTA, Luiane Caroline Vieira da; CECIM, Jessica da Silva Rodrigues.

Investigando a Gravidez na Adolescência por Meio da Geografia: a utilização da aprendizagem baseada em problemas no Pibic-ensino médio. In: Anais do 7º Encontro Regional de Ensino de Geografia: Geografia, Escola e Tecnologias, discursos atuais e encontros possíveis. Universidade Estadual de Campinas, 2021.

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