Obra pretende ser porta de entrada para o ideário de expoente do Iluminismo escocês
Eveline Campos Hauck, pesquisadora e colaboradora do Instituto de Economia (IE) da Unicamp, estudou o pensamento político do escocês Adam Ferguson em seu doutorado. Sua pesquisa resultou na obra Introdução à filosofia política de Adam Ferguson.
Adam Ferguson (1723-1816) foi professor na Universidade de Edimburgo e publicou obras que foram traduzidas para diversos idiomas, sendo até hoje uma importante figura do Iluminismo escocês. O livro propõe-se a ser uma porta de entrada para as ideias políticas desse pensador, abrangendo como público não apenas estudantes de filosofia, mas interessados em ciências humanas de modo geral.
Jornal da Unicamp – O que motivou sua pesquisa sobre o Iluminismo escocês e, especificamente, sobre esse autor?
Eveline Campos Hauck – Na verdade, cheguei ao Iluminismo escocês por um caminho tortuoso. Durante a graduação, gostava dos cursos de Estética e queria estudar [Friedrich] Schiller; mais particularmente, eu me interessava pela ligação entre ética/política e estética. Foi o professor Márcio Suzuki, meu orientador no mestrado, quem me mostrou o Ensaio sobre a história da sociedade civil, de Adam Ferguson.
Segundo Suzuki, Schiller teria lido a filosofia moral e política de Ferguson por intermédio de Christian Garve, tradutor e divulgador da filosofia escocesa na Alemanha. Meu mestrado foi, então, a tradução das Instituições de Filosofia Moral, de Ferguson, hoje publicada pela Editora Unesp, juntamente com a tradução do Ensaio por Pedro Paulo Pimenta. Essa obra foi antecedida por uma análise introdutória que mostrava justamente o caminho da recepção da filosofia fergusoniana na obra de Schiller, sobretudo, no que concerne aos conceitos de “propensão” (propensity) e “jogo” (play). No doutorado, decidi estudar de maneira mais aprofundada o pensamento político de Ferguson. Agora, me dedico à filosofia/teoria política de Adam Smith, autor mais conhecido do Iluminismo escocês, que foi colega e contemporâneo de Ferguson.
JU – Qual a importância de Ferguson para a história da filosofia? E para a ciência política?
Eveline Campos Hauck – É um lugar-comum dos estudiosos de Ferguson afirmar que ele apresentou uma visão com mais nuances das sociedades comerciais modernas de sua época, colocando em questão tanto os mecanismos econômicos que sustentavam o comércio (há uma crítica contundente à divisão do trabalho) como a capacidade militar e política dos Estados europeus. Esse, talvez, seja o aspecto mais interessante do pensamento político do autor, mas há também uma análise bastante sofisticada do desenvolvimento social — o que foi visto por muitos como sociologia avant la lettre.
Creio que a filosofia de Adam Ferguson tenha importância para as ciências humanas ou sociais de modo geral. Há ainda, nessa linha, uma contribuição para a teoria da história (filosofia da história), já que o autor se dedicou a pensar sobre o uso que fazemos dos dados factuais, tendo escrito, aliás, sua própria História do Progresso e Fim da República Romana.
JU – Qual a contribuição da filosofia política de Ferguson para os dias de hoje?
Eveline Campos Hauck – Acredito que só seja possível tratar da contribuição de qualquer autor do passado para os dias de hoje se fizermos uma análise da sua recepção ao longo do tempo. Nesse sentido, vale destacar o caminho que as ideias morais e políticas de Ferguson percorreram da Grã-Bretanha para a Alemanha; eu destacaria a contribuição de Ferguson para o estabelecimento da noção de sociedade civil, tal como aparece em [Georg Wilhelm Friedrich] Hegel, e para a crítica da divisão do trabalho, desenvolvida por [Karl] Marx — isso no século XIX.
Forçando um pouco a mão, poderia dizer também que, mais amplamente, Ferguson — que, no século XX, foi denominado, por uma série de pensadores franceses, “o político” — esforçou-se para restituir a centralidade da política, em um momento em que a economia política despontava como campo organizador da vida social.
JU– O seu livro é apresentado como uma “introdução” ao pensamento desse autor. A obra despertará mais interesse na filosofia ou na ciência política?
Eveline Campos Hauck – Como eu disse anteriormente, Ferguson escreveu em uma época em que as ciências humanas — aplicadas ou não — eram tratadas enquanto filosofia. Portanto, creio que a filosofia fergusoniana possa interessar a todo o campo, hoje subdividido, das humanidades. É claro que, pela relevância do Iluminismo escocês para a história da filosofia, talvez os estudantes de filosofia sejam o público-alvo imediato, mas, de modo geral, uma “introdução” ao pensamento político de Ferguson deve interessar a todos aqueles envolvidos com a história do pensamento social.
Título: Introdução à filosofia política de Adam Ferguson
Autora: Eveline Campos Hauck
Ano: 2022
Páginas: 208
Páginas: 14 x 21 cm